O pós-abolição vem sendo caracterizado, no que se refere às experiências de ex-escravos e antigos senhores, como um período de redefinição de hierarquias sociais. Um dos assuntos mais instigantes dentro dessa temática é, sem dúvida, a questão dos múltiplos significados atribuídos à liberdade, bem como as diversas maneiras com que ela se associava a outros aspectos da realidade social. Tomando como foco o oeste paulista cafeeiro do início do século XX, o presente artigo pretende demonstrar que, dentro das dinâmicas de sociabilidade constituídas por fazendeiros/administradores e trabalhadores negros, estavam subjacentes disputas acerca de certas formas de articulação entre trabalho e intimidade, enfatizando que essa articulação era uma das chaves para se pensar a liberdade dos egressos da escravidão. Através do exame de um inquérito policial da época, percebeu-se que ex-escravos e seus descendentes estavam empenhados em afirmar um estatuto social de livre, o qual, por sua vez, passava pela atribuição de significados a um determinado ideal de intimidade/privacidade. Argumenta-se, por meio da utilização de conceitos da sociologia econômica, que os conflitos em torno dessa dimensão da liberdade adquiriram, na conjuntura abordada, relevância fundamental dentro do processo social de constituição de um mercado de trabalho livre.