ResumoA mata virgem é um elemento recorrente no imaginário social brasileiro. Embora já se tenha provado o equívoco de se considerar areas florestais "virgens", a ação humana, mesmo que indireta, deixou marcas por todo o planeta. Este ensaio procura, justamente, compreender os motivos da persistência da expressão mata virgem em nosso imaginário. Postula-se que mata virgem é parte de um mito moderno sobre a natureza; é um "malentendido" pertencente a uma cultura etnocêntrica; é uma ideologia justificadora da dominação ocidental; é uma representação apropriada e reelaborada em diferentes configurações sociais; é um elemento de longa duração, ancorado na disjunção da natureza e da cultura, que faz parte da visão de mundo hegemônica no Ocidente.
Palavras-chave: Mito. Representação. Natureza. Para chegar ao fundo de "'mata virgem" é necessário escavar grossas camadas de memória que compõem o nosso imaginário sobre a natureza (SCHAMA, 1996: 27). A expressão mata virgem ainda é amplamente utilizada no senso comum, às vezes como sinônimo de floresta primária ou para indicar uma floresta que, simplesmente, esteja em pé, independentemente de seu estado de antropização. É uma expressão dicionarizada, assim expressa: "Mata virgem. 1. Bras. Floresta natural e primitiva, ainda não explorada: 'Era um alto jequitibá, relíquia da antiga mata virgem' (José de Alencar, O Tronco do Ipê, p. 172). (NOVO Aurélio, 200?.)". A imagem de mata virgem remete a uma pureza, a uma não-corrupção, presente na valoração da virgindade feminina no mundo ocidental, que pode ser interpretada a partir de uma chave psicologizante, mas o que aqui se pretende destacar refere-se à conotação de nãoexploração "produtiva" e à não-presença humana na paisagem. Artigo NO FUNDO DA MATA VIRGEM: a complexidade de um elemento mítico no imaginário ocidental sobre a natureza Ely Bergo de Carvalho Florianópolis, v. 2, n. 2, p. 135 -153,