Assistimos, na actualidade, a uma crescente preocupação com o papel das políticas de acção dos governos na perpetuação de ciclos de violência. No entanto, a violência de Estado (da guerra à tortura, ou à violência policial) foi, até recentemente, um tema negligenciado pela comunidade criminológica (Aas, 2007;Young, 2007). O presente estudo visa conhecer a real extensão da tolerância e legitimação da violência de Estado por parte dos cidadãos comuns. Apesar de este texto se focar apenas nos dados portugueses, este é um projecto que está a ser conduzido em quarenta e três países de todo o mundo através do Group on International Perspectives on Governmental Aggression and Peace (GIPGAP). Com o intuito de contribuir para o conhecimento dos processos de legitimação da violência de Estado por parte de cidadãos portugueses, procedeu-se a uma análise comparativa do posicionamento de 600 participantes face a diferentes tipos de violência de Estado. Partindo da identificação dos argumentos utilizados pelos participantes para legitimar ou rejeitar cada tipo de violência, procurou-se depois perceber em que medida estes posicionamentos se diferenciam em função do grau de normatividade do acto (percebido como legal ou ilegal), da sua natureza (por exemplo: agressão ou morte) e do alvo do mesmo (por exemplo: civis ou prisioneiros de guerra).Palavras-chave: Contra-terrorismo, Invasão, Pena de morte, Tortura, Violência policial.
VIOLÊNCIA DE ESTADOA violência de Estado foi, até recentemente, um tema em larga medida esquecido pela criminologia (Aas, 2007;Young, 2007). Como referem Green e Ward (2004), o aspecto mais surpreendente da teorização criminológica sobre a violência de Estado é a pouca atenção que lhe tem sido dedicada e o pouco que sabemos sobre o assunto. Temas como a tortura, por exemplo, têm recebido uma atenção surpreendentemente escassa e a pouca teorização sobre a violência política tem-se centrado tendencialmente nos actos perpetrados por grupos infra-nacionais, ecoando as definições tradicionais do terrorismo e esquecendo a violência institucional, exercida por agentes do Estado ou em seu nome (Ross, 2003).Green e Ward (2004) propõem uma tipologia dos crimes cometidos pelo Estado, na qual incluem a corrupção, algumas dimensões do crime corporativo e do crime organizado, os crimes ambientais, a violência policial, o terrorismo de Estado, a tortura e o genocídio. Por sua vez, Fattah (1997) distingue os assassinatos cometidos pelo Estado (e.g., genocídio, execuções extrajudiciais, execuções sumárias), o abuso de poder político (e.g., tortura, internamento em campos de concentração, experimentação em seres humanos) e o crime organizado por agentes do Estado. Considera, ainda, que nestes crimes podem estar envolvidas corporações legais, sujeitos
215A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: