Crianças e adolescentes transexuais brasileiros: atributos associados à qualidade de vida

Abstract

A construção de gênero é um reflexo dos percursos sociais e culturais. Pessoas transgêneras são aquelas cuja identidade de gênero diferencia-se do sexo biológico. A infância e adolescência são demarcados pela construção de identidades e questões relativas ao gênero. Estudos sobre Qualidade de Vida de crianças e adolescentes são de grande relevância pela especificidade dessa população. O presente estudo qualitativo tem como objetivo descrever os atributos associados à Qualidade de Vida de crianças e adolescentes transgêneros brasileiros segundo sua própria percepção. Os participantes, entre oito e 18 anos, participaram de grupos focais ou entrevistas. Os depoimentos foram transcritos, agrupados com auxílio do software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires, versão 0.7 alpha 2 e descritos segundo a definição da Organização Mundial da Saúde no que concerne às dimensões mental, física e social. Os resultados apontam a participação de crianças com média de idade igual a 9,9 anos, desvio-padrão de 0,9 ano. No grupo dos adolescentes, a média de idade foi de 15,9 anos, desvio-padrão de 1,5 anos. Em relação ao gênero, 58,3% das crianças se identificam com o feminino e, os adolescentes, 80,0% com o masculino. Os depoimentos foram categorizados em cinco classes para as crianças e quatro para adolescentes, trazendo subsídios para a compreensão dos atributos que impactam positiva ou negativamente na Qualidade de Vida das crianças e adolescentes transgêneros brasileiros. A partir disso, foi possível identificar o núcleo familiar como o principal meio de suporte social, que impacta positivamente na Qualidade de Vida das crianças e adolescentes transgêneros. Por outro lado, a vivência de preconceito e discriminação foram atributos negativos associados a Qualidade de vida. A transexualidade na infância e adolescência é um tema pouco estudado no Brasil. Os depoimentos indicam que a vida das crianças e adolescentes transgêneros é impactada por fatores sociais, físicos e mentais em virtude do estigma e discriminação vivenciados. Espera-se com esse estudo contribuir com a formulação de políticas públicas antitransfóbicas e ampliar a discussão sobre deveres e direitos dos cidadãos frente à transexualidade/transgeneridade.

Fatores associados a qualidade de vida de pessoas transexuais: uma revisão integrativa

“…Hasan, et al, (2017) ressaltam a importância de uma rede de apoio e acolhimento (apoio familiar etc) na vida de pessoas transexuais e concluem que a discriminação intrafamiliar, falta de suporte emocional e apoio trazem risco à saúde emocional e qualidade de vida dessa população. Portanto, o apoio familiar está diretamente associado à QV de transexuais (Nascimento, 2019).…”

“…Esse conceito vem sofrendo alterações com o passar dos anos, surgindo então a denominação de pessoas transexuais, que são aquelas que não se identificam com a morfologia corporal biológica, e sentem desconforto diante do sexo ao qual nasceram, desejando ser reconhecidas como mulheres e homens transgêneros (Jesus, 2012;Zanette, 2016;Nascimento, 2019). A transexualidade é classificada no Código Internacional de Doenças (CID-11) como uma incongruência de gênero, na categoria "Condições relacionadas à saúde sexual" (Organização Mundial de Saúde, 2019b).…”

Rede de proteção e política de convivência: reflexões sobre a práxis

“…As "Orientações técnicas: serviços de acolhimento para crianças e adolescentes" (Brasil, 2009) foram publicadas com o objetivo de estabelecer os parâmetros e os princípios norteadores do funcionamento das diversas modalidades de serviço de acolhimento existentes no país. Apesar de reafirmar o direito à convivência familiar e comunitária e estabelecer uma série de ações e critérios a fim de evitar a institucionalização prolongada (Moreira, 2014), essas orientações exigem um olhar mais atento sobre a lógica que as sustenta, isto é, a associação entre proteção e controle, a qual permite ao poder público intervir junto às famílias ditas negligentes, consideradas perigosas para si e a sociedade, a fim de ordená-las, tutelá-las e pacificá-las por meio de discursos hegemônicos, práticas profissionais, leis e instituições (Nascimento, 2015).…”

É muito além do que eu posso imaginar: professores e a não-conformidade de gênero expressa por jovens trans no território escolar

“…Parte da literatura que discute a relação entre pessoas trans e educação aponta o final do ensino fundamental e, em particular, o ensino médio como etapas críticas, nas quais a inadequação às expectativas sociais de gênero adquire maior visibilidade (ALVES et al, 2018;ANDRADE, 2012;NASCIMENTO, 2019;ROCON et al, 2018;SANTOS, 2010). Seja com o uso de roupas, adereços, modos de se expressar e comportamentos, seja com a afirmação de um gênero distinto daquele atribuído no nascimento -como no relato exposto no início -, quanto mais a expressão de gênero se afasta do que se espera socialmente para corpos identificados como masculinos ou femininos, mais confusões e possíveis tensões são produzidas no espaço escolar (ALVES et al, 2018;ANDRADE, 2012;DUQUE, 2009;SALES, 2012;SANTOS, 2010).…”