Comunicação e Gênero no Brasil: discutindo a relação

Abstract

Trata-se de identificar vinculações entre os estudos de comunicação e questões de gênero, no Brasil. Em chave histórica, destacam-se singularidades dos debates teóricos associados ao feminismo brasileiro e seu impacto na agenda de pesquisa da Comunicação. Desse modo, observam-se modificações pelas quais a pesquisa e suas categorias foram passando ao longo de 1970 até 2015. A partir daí possivelmente se constitua novo impulso ainda em processo. Na arrancada inaugural (1970/1980), sobressai o uso sistemático da categoria mulher; no segundo impulso (1990), embora o termo gênero seja acionado, funciona mais como etiqueta; no terceiro (2000-2015), é a crítica ao pós-feminismo que desponta, evidenciando a primeira convergência entre Sul e Norte. Por fim, o último impulso recente se desenha a partir da primavera feminista e o horizonte aberto pela explosão dos feminismos, impulsionado pelas novas mídias digitais. Contudo, não dá para subestimar a formação na década de 2010 de uma cruzada moral contra o reconhecimento da diversidade de gênero e sexualidade, bem como a ascensão de uma extrema-direita que potencializa e promove um discurso antifeminista.

Construindo sombras com “ideologia de gênero”

“…Uma das principais ferramentas utilizadas como meio de propagação desse tipo de conteúdo foi a plataforma do Twitter que, somente em 2020, passou a ter um filtro para barrar e notificar os usuários sobre conteúdos identificados como fake news. O próprio conceito de fake news, segundo Wardle (2018) deve ser utilizado com cautela, pois a classe política tem deslizado o sentido de fake news para abarcar críticas, checagens e reportagens qualificadas como forma de confundir o eleitorado. Para a pesquisadora, o conceito de misinformation coloca no centro o objeto a que estamos nos referindo: a manipulação, a descontextualização e a produção de factoides com o propósito de enganar e influenciar o público, articulado com o que Cohen (2002) chama de moral panics -a construção de conteúdos alarmistas com base na paleta da moralidade, mobilizando eleitores para partirem para diversas formas de confronto.…”

“…Biroli, Vaggione e Machado (2020) em Gênero, Neoconservadorismo e Democracia problematizam o fato de como -dentro de um movimento internacional -essas disputas contaminarem desde o seio das famílias aos sistemas jurídicos e políticos. Esses discursos são desconstruídos e reforçados, inclusive, por correntes acadêmicas antifeministas e pós-feministas que surgiram concomitantemente à vitalidade do debate de gênero nos anos 1990(ESCOSTEGUY, 2020). Esse disputado cenário gera dificuldade em trazer o tema para debate social e um "denuncismo" daqueles que verbalizam tais debates no seio democrático.…”

As atrações em uma trajetória intelectual: a força das mestras

“…Além disso, em termos de produção intelectual, tenho empenhado esforços na direção de reconstituir, em chave histórica, rastros de influxos teóricos associados aos feminismos do Brasil, mas também do Norte, e seu impacto na agenda nacional de pesquisa em Comunicação e gênero (Ana Carolina Escosteguy, 2020a). Igualmente, em perspectiva histórica, experimentei uma via metodológica que transita entre biografia intelectual e história da pesquisa latino-americana em Comunicação, na análise de 4 Onde atuei como professora visitante, no período de 2017-2020.…”

Família, escola e consumo cultural: articulações do campo empírico para analisar o consumo midiático

“…Para Roseli Figaro e Rafael Grohmann (2013), a questão de classe, cuja desigualdade histórica proporciona experiências extremas em nosso país, aparece nos estudos de comunicação como tema secundário, irrelevante, acompanhando uma tendência mundial no cenário político e acadêmico. Já a perspectiva de gênero é observada por Ana Carolina Escosteguy (2020), como uma relação que tem se desenvolvido nos últimos anos, em especial a partir da aproximação dos estudos com as pautas dos ativismos presentes na internet e a inclusão gradual da temática sobre as identidades LGBTQIA+ e as lutas dos feminismos na mídia.…”