Este estudo tem por objetivo traçar um panorama das mudanças de utilização da terra e de tipo de produção ocorridas na agricultura familiar (AF) brasileira entre os censos agropecuários de 2006 e 2017.O principal dado verificado nos resultados do último censo em relação ao anterior foi a redução do número de estabelecimentos da AF, que, entretanto, não foi acompanhada por uma diminuição proporcional da área de estabelecimentos agrícolas familiares: essa área se manteve praticamente inalterada entre os censos -oscilando de 80,1 milhões de hectares, em 2006, para 80,9 milhões de hectares, em 2017. Del Grossi et al. (2019) deixaram claro que a redução do número de estabelecimentos familiares, ou, antes, a "desclassificação" metodológica de pequenos produtores como agricultores familiares, explica-se pelo aumento expressivo de pequenas unidades produtivas, com predomínio de mão de obra contratada e da renda obtida fora dos estabelecimentos, descumprindo, portanto, dois critérios que informam o conceito legal de AF. 2 1. Técnico de planejamento e pesquisa na Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc) do Ipea. 2. Pela Lei n o 11.326/2006, com alteração dada pelo Decreto n o 9.064/2017. Agricultura Familiar (AF) no Brasil: um panorama da produção, do perfil e dos sinais de mudanças entre os censos agropecuários de 2006 e 2017 | 151introdução. O primeiro intenta qualificar, a partir dos dados regionais, como se deu a redução do número de estabelecimentos familiares; o segundo dá continuidade a essa análise comparando as formas de utilização da terra, em estabelecimentos da AF, entre os censos agropecuários 2006 e 2017; e o terceiro se dedica a mostrar como essa mudança de panorama influiu sobre os dados de produção. As considerações finais fecham o texto.
A REDUÇÃO DO NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS DA AFLevando em conta as diferenças metodológicas entre as duas edições -2006 e 2017 -, assinaladas em Del Grossi (2019), o censo agropecuário de 2017 registrou uma diminuição do número total de estabelecimentos agropecuários familiares: de 4,36 milhões, em 2006, passou a 3,89 milhões de estabelecimentos no último censo, queda de quase 12%. A tabela 1 mostra como a variação dos números por região convergiu para esse resultado negativo. TABELA 1 Brasil e Grandes Regiões (GRs): estabelecimentos familiares e participação relativa sobre o total Brasil e GRs 2006 2017 TABELA 2 Brasil e GRs: área de estabelecimentos familiares e participação relativa sobre o total Brasil e GRs 2006 2017 Total (ha) AF (ha) AF/total (%) Total (ha) AF (ha) AF/total (%)