ApresentaçãoDe família, reprodução e parentesco: algumas considerações * A família, como assunto de análise, tem gozado de pouca popularidade entre os cientistas sociais nas últimas décadas. Não é por acaso que, na introdução ao dossiê especial sobre "comportamentos familiares" da Revista Interseções, Clarice Peixoto e Michel Bozon (2001:25) chamam atenção para o fato dos autores, especialmente os brasileiros, não explicitarem espontaneamente a análise dos comportamentos familiares. É como se o material sobre as relações familiares emergisse apesar dos analistas. Aliás, não só os brasileiros sentem desconforto com a "família". Bob Edgar (2003), pesquisador britânico, abre um recente volume sobre a Sociologia das Famílias, comentando o desafeto de pesquisadores com o tema e apontando para os ardis analíticos que parecem assombrar o campo. Se, por um lado, existe uma tendência de reificar as "estruturas familiares", sobredeterminando sua influência sobre os membros da família, por outro, confrontamo-nos com a análise psicológica centrada no "self", que, dominada pela ideologia individualista, pensa a coletividade em termos de suporte ou entrave à realização pessoal. Em recente artigo, eu mesma analiso o suposto "período de silêncio" que encobriu discussões antropológicas sobre o parentesco por mais de uma década (Fonseca, 2004). É como se, depois da obra seminal de Schneider (1984), "o parentesco" -essa mola mestre da disciplina -tivesse expirado de vez. Somente no final dos anos 90 -e com problemática radicalmente transformada em função de críticas advindas da pesquisa feminista, pós-colonialista, gay e lésbica, etc. -testemunhamos o retorno de * Gostaria de agradecer a ajuda na organização desse volume de Iara Beleli e Flavia de Mattos Motta.