Parques Nacionais, turismo e governança

Abstract

A concessão dos serviços turísticos em Parques Nacionais, baseada em parcerias público-privadas, constitui o principal mecanismo da gestão do uso público desta categoria de unidade de conservação no Brasil. A opção pelo modelo é justificada por seu potencial de sustentabilidade, capaz de fazer convergir interesses conservacionistas e econômicos. Essa habilidade tem sido questionada, principalmente, no que tange às possibilidades de participação de comunidades locais na gestão, aspecto basilar da proposta, que pretende ser referência de governança. Nesse artigo, procurou-se através de revisão bibliográfica, refletir sobre como se configuram os processos participativos no âmbito da implementação e gestão dessas concessões. As análises identificam a prevalência da racionalidade econômica na tomada de decisão e grandes dificuldades em considerar os valores socioculturais na gestão, inclusive na resolução de conflitos fundiários e sociais ocorridos com a implementação dos próprios parques. A participação social é concebida em termos retóricos ou de forma subordinada. Os padrões históricos de exclusão perpetuam-se sob qualificativos de eco ou sustentável sob forte apelo ao ecoturismo, mas sem conexões reais com a proposta. Nesse quadro, é importante atentar para adoção de políticas públicas orientadas efetivamente por uma acepção de ecoturismo capaz de promover a integração do turismo à diversidade sociocultural, à conservação da natureza e de oportunidades para o desenvolvimento da governança local.

Desafios para inclusão de empreendimentos comunitários na gestão de uso público do Parque Nacional da Serra da Bocaina

“…Esse equilíbrio de poder deságua na corresponsabilização das partes para garantir a qualidade das atividades realizadas, conservação ambiental e desenvolvimento local. No entanto, ainda existe uma grande dificuldade em agregar valores sociais e culturais na gestão das áreas protegidas, o que obsta, ou mesmo impede, que arranjos institucionais para a gestão do uso público inclusivos sejam implantados (DIEGUES, 2001;BRUMATTI;ROZENDO, 2021).…”

“…Na prática, isso se reflete nas limitações, ou até mesmo, na inexistência de políticas públicas e os processos operacionais adequados para o estabelecimento de cooperação entre comunitários e órgãos públicos, que abarquem as economias plurais existentes e transcendam o uso econômico da natureza (COSTA;BAHIA, 2019;ABRUCIO, 2019;BRUMATTI;ROZENDO, 2021).…”

“…Com o intuito de resguardar as paisagens naturais e perpetuar a permanência dos atrativos para sociedades urbanas, a legislação ambiental inseriu categorias de unidade de conservação restritivas sem qualquer consulta aos habitantes desses territórios. Tais restrições impuseram desde limitações aos modos de vida tradicionais e uso ancestral dos territórios, até a realocação de populações culturalmente diferenciadas dos seus territórios sagrados e/ou ancestrais para locais distintos (DIEGUES, 2001;BRUMATTI;ROZENDO, 2021;YOUNG;MEDEIROS, 2018).…”

“…O turismo e a recreação, bem como suas interfaces com ações educativas e científicas, são atividades que podem ser realizadas nos parques nacionais, estaduais e municipais desde o final da década de 1970 (BRASIL, 1979). A promoção de programas recreacionais, de uso público e de ecoturismo em áreas protegidas, orientados pelo SNUC e Plano Nacional Estratégico de Áreas Protegidas (PNAP), foi impulsionada com a criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio/MMA) em 2007 (BRASIL, 2000;BRUMATTI;ROZENDO, 2021).…”

“…O acesso ao patrimônio natural e cultural à visitação pública demanda investimentos, que podem ser providos diretamente pelo Estado ou indiretamente por entes privados, em infraestrutura adequada e serviços específicos GODOY, 2013). A política ambiental vigente aponta a concessão de serviços e, mais recentemente, de áreas em unidades de conservação para grandes empresas como solução para melhoria da infraestrutura e gestão eficiente dos ativos públicos, com geração de trabalho para as populações locais (por exemplo, Lei nº 16.260/2016 da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo; Instrução Normativa do ICMBio nº 2/2017; Lei nº 13.668/2018 da Presidência da República) (RODRIGUES; ABRUCIO, 2019;BRUMATTI;ROZENDO, 2021;SEMEIA, 2021).…”