Argumentamos que Memórias do cárcere, de Graciliano Ramos, e sua tradução em Mémoires de prison encenam a noção que Jacques Derrida (1986, 1992, 2007) enseja de escrita como a abertura de um ferimento que lamenta e testemunha o instante não mais presente da sua efração. O processo narrativo das Memórias põe em movimento um constante embate para exumar o passado traumático, reabrindo a ferida para o testemunho do leitor. Partindo do contato com as "agruras" do outro, a tradução para o francês se desdobra de modo que as impressões do contato com o relato pungente de Graciliano influenciam nas transformações que os tradutores operam no corpo do texto. Nesse cenário, tem lugar um "corpo-a-corpo" na língua e na escrita, ao qual Derrida (2007) alude. Por meio desse movimento, o original, que já não é pleno e imune a fissuras, é ferido, porém, ao mesmo tempo, sobrevive e continua a testemunhar na escrita tradutória. Discutimos como a escrita do trauma gera em si uma fissura na trama testemunhal de Graciliano Ramos e como Mémoires de prison a revela, ao passo que abre ainda mais a cesura. Nossa análise parte da leitura do primeiro volume da obra -Viagens -e da tradução. Palavras-chave: Tradução; Jacques Derrida; Memórias do cárcere; Escrita testemunhal.