A emergência do acompanhamento terapêutico e as políticas de saúde mental

Abstract

Este trabalho visa analisar o processo de emergência do acompanhamento terapêutico (AT). Pretende-se, desse modo, fazer uma viagem crítica pelo mundo das ciências da saúde, tendo como campo de problematização as atividades do AT a partir da segunda metade do século XX. Tradicionalmente, essa prática é pensada em uma "perspectiva integrativa", baseada na idéia de uma "adaptação unidirecional" do paciente. Entendemos, no entanto, que a experiência de conviver com os inusitados encontros que ocorrem nas intervenções do AT produz efeitos que extrapolam as "metas adaptativas", os "protocolos institucionalizantes" e apontam uma dimensão clínica, política e artística da experimentação das relações de força e dos processos de subjetivação aí implicados.

Acompanhamento Terapêutico (At) E Reforma Psiquiátrica: História De Uma Prática

“…Dessa forma, foi possível conceber, a partir da literatura estudada, que o golpe militar ocorrido em 1964 possibilitou diversas transformações no âmbito da saúde pública do país: em virtude do desinvestimento por parte do governo federal, houve um fortalecimento do modelo manicomial, visto que a estratégia seria ampliar a construção de clínicas psiquiátricas beneficiando o setor privado (Silva & Silva, 2006). Entre a década de 60 e o início da década de 80, houve interrupção no movimento de crítica ao modelo manicomial, bem como o crescimento do número de novos hospitais psiquiátricos (Silva & Silva, 2006). Apenas no período inicial de abertura política, após uma série de denúncias às práticas ocorridas nesses espaços, a reforma psiquiátrica tomou força no país por meio do projeto de lei nº 3657/89, referente à "Lei da Reforma Psiquiátrica".…”

“…O AT surge no Brasil nesta conjuntura, como uma ruptura da lógica manicomial e de controle subjetivo (Silva & Silva, 2006), tendo encontrado espaço de inserção na rede pública de saúde mental e nas iniciativas privadas de assistência. No processo de transformação do cuidado em saúde mental no Brasil, Tristão e Avellar (2014) mencionam o surgimento dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dos Serviços Residenciais Terapêuticos e do Programa de Volta pra Casa como recursos importantes para a efetivação da reforma psiquiátrica no país.…”

“…Situada em Porto Alegre, a Clínica Pinel foi o primeiro lugar a oferecer o AT, ainda com a função denominada "atendente psiquiátrico", inaugurando o campo do AT no Brasil (Silva & Silva, 2006;Tristão & Avellar, 2014). Sobre a Clínica Pinel, Simões (2005), enfatiza a influência recebida do tratamento oferecido nas Comunidades Terapêuticas inglesas: reestruturação da dinâmica institucional e participação dos pacientes nas medidas tomadas.…”

“…Na clínica eram oferecidos serviços considerados até então como "inovadores", tais como: socioterapia, reuniões comunitárias, grupos operativos, entre outros. Dentre estes serviços, estava a prática do AT, proposta por Blaya, que durante a sua formação nos EUA teria se interessado pelo trabalho dos agentes que andavam com os "loucos" pelas ruas (Silva & Silva, 2006). É importante ressaltar que, apesar das intenções terapêuticas, nesse momento o AT surgia na Clínica Pinel ainda como uma forma de contenção do louco e estava em consonância com uma prática privada de assistência em saúde.…”

“…É importante ressaltar que, apesar das intenções terapêuticas, nesse momento o AT surgia na Clínica Pinel ainda como uma forma de contenção do louco e estava em consonância com uma prática privada de assistência em saúde. Os acompanhantes terapêuticos (ats) eram conhecidos como "atendentes grude", principalmente em situações de risco, suicídio e/ou de agressão (Silva & Silva, 2006).…”