O pensamento dos militares em política internacional (1961-1989)

Abstract

Uma questão de fundo pode ser levantada entre estudiosos das relações internacionais do Brasil: existiria um pensamento genuinamente brasileiro em política internacional? Na hipótese de que esse pensamento de fato exista, poderia ser indagado, de um lado, se a teoria seria um dos elementos a colaborar na sua elaboração e, de outro, em que segmentos da sociedade brasileira deveriam ser buscadas suas raízes intelectuais.Excluindo da esfera da teoria das relações internacionais as teorias da dependência, do imperialismo e suas derivações, Amado Luiz Cervo conclui pela existência, no Brasil, de um pensamento sem teoria. Esse pensamento fluiria de vertentes heterogêneas: a intelectualidade, o meio político e diplomático, o militar e outras lideranças sociais. Gelson Fonseca Jr., por seu turno, identifica no "modo brasileiro" de refletir sobre relações internacionais a busca de uma compreensão específica do andamento da Política Externa do país. A teoria, mais uma vez, ficaria em segundo plano 1 .Guardadas as devidas diferenças no grau de envolvimento com a ação diplomática propriamente dita e nas suas respectivas vinculações institucionais (no âmbito do Estado ou fora dele), três segmentos da sociedade brasileira assumem posição de relevo nas discussões afetas às relações internacionais: acadêmicos, diplomatas e militares 2 . Este artigo pretende abordar, de modo muito genérico, questões relacionadas à evolução do pensamento destes últimos em matéria de política internacional e política externa, restringindo o escopo da análise ao período 1961-1989, em função do interesse histórico que tal corte cronológico apresenta ao observador situado nos anos 1990 3 . Muito já se produziu, na área de estudos estratégicos, a respeito de temas relacionados à geopolítica e à segurança nacional no pensamento dos militares brasileiros. Há, no entanto, poucos trabalhos específicos

Defesa, Política Externa e Pensamento Militar Brasileiro (2003-2016)

“…Como aponta Garcia (1997), três grupos da sociedade brasileira assumem, com diferentes graus de envolvimento e responsabilidades, posições de destaque nas discussões sobre as relações internacionais no Brasil: diplomatas, acadêmicos e militares. Com efeito, os estudos sobre a política exterior brasileira passam inevitavelmente pela leitura e discussão de textos e autores que se encaixam em um destes segmentos destacados pelo autor.…”

“…Com efeito, os estudos sobre a política exterior brasileira passam inevitavelmente pela leitura e discussão de textos e autores que se encaixam em um destes segmentos destacados pelo autor. No entanto, a contribuição do pensamento dos militares para as relações exteriores do país se relaciona, em geral, com a visão sobre geopolítica e segurança nacional (GARCIA, 1997) Garcia (1997), curiosamente um diplomata, que ressaltou traços que caracterizaram o pensamento militar em política internacional ao longo dos anos 1961-1989, partindo da doutrina prevalecente nas Forças Armadas neste período e do levantamento de revistas e periódicos nacionais militares.…”

“…Esta doutrina, baseada no eixo segurança-desenvolvimento, pode ser vista como uma versão atualizada e sistematizada do pensamento de Goés Monteiro (TREVISAN, 2005). Além de suas contribuições, a DSN também se valeu do pensamento geopolítico brasileiro, fornecendo uma ideologia legitimadora para o projeto nacional de um Estado autoritário (GARCIA, 1997).…”

“…O pensamento geopolítico era baseado principalmente nas reflexões dos Generais Golbery do Couto e Silva e, em menor escala, Carlos de Meira Mattos, cujas visões refletiam o destino do Brasil como grande potência, relacionado às suas condições geográficas e recursos naturais, e a projeção de poder regional (GARCIA, 1997). Embora existissem grupos divergentes, a DSN se tornou majoritária nas Forças Armadas.…”

“…A ênfase da organização militar nos assuntos domésticos, em detrimento aos externos, teve impacto para as doutrinas e para o pensamento dos militares. Garcia (1997) chama atenção para uma curiosidade neste sentido. A lógica da guerra interna inerente à DSN fez com que os estudos sobre relações internacionais estivessem em um plano secundário na organização militar.…”