RESUMO.Este ensaio pretende criticar alguns pressupostos conceituais implicados em abordagens sobre a formação do Estado que o inscrevem numa teleologia de modernidade institucional. Ao final, apresento uma breve crítica ao conceito 'economia política das mercês', demonstrando o quanto se torna desnecessário para a compreensão do funcionamento da soberania, autoridade, administração pública e relações sociais no Antigo Regime.Palavras-chave: estado, antigo regime, controvérsia.ABSTRACT. Some implications of Modern in Modern State. This essay intends to criticize some constructs which determinate approaches that focus the making of State in the Early Modern Europe on teleological interpretative keys of institutional modernity. At the end, I show a short critical approach that demonstrates how 'political economy of gratia' becomes utterly unnecessary to an historical understanding of the functions of sovereignty, authority, public administration and social relations in the Ancient Regime.Keywords: state, ancient regime, controversy.
IntroduçãoNeste ensaio, gostaria de apresentar, sucintamente, algumas contradições na racionalização historiográfica sobre o tema Estado Moderno. A díade conceitual 'Moderno e Estado' parece tão consolidada e habitual nas Ciências Humanas que mal paramos para refletir sobre o fato de que faz parte de uma construção historiográfica recente, implicada com uma noção de tempo linear e evolutiva -o que significa intolerante com a simultaneidade de outros regimes de tempo e outras formas de razão -, assim como, está implicada com uma concepção de preparação do advento da soberania nacional. Então, neste ensaio, importa não nos deixarmos intimidar por sanções pedagógicas herdadas do liberalismo europeu institucionalizado ao longo dos séculos XIX e XX e, assim, jogar com algumas de suas categorias visando a transgredi-las. É este convite que faço ao leitor.Para tanto, um passo importante consiste em quebrantar o encanto das categorias de modernidade projetadas teleologicamente para Europa entre os séculos XV e XVIII e, deste modo, buscar examinar a experiência singular das dinâmicas institucionais e sociais do poder político no mundo europeu e colonial anterior ao liberalismo. Este exercício de alteridade histórica é importante para que evitemos hierarquizar sociedades e épocas em função do advento da modernidade, o que empobreceria a análise ao reduzi-la ao inventário (teleológico) dos graus de avanço ou atraso em relação a um único paradigma de Estado, tempo, razão e soberania.Ora, que categorias de modernidade institucional são recorrentemente acionadas quando se trata do tema Estado Moderno? Resposta: unificação territorial conjugada à uniformização de leis, códigos e regimes jurídicos; secularização do poder político, geralmente associado ao tema da Razão de Estado; centralização do poder político conjugada à construção de uma soberania unilateral e externa à lógica corporatista de constituição de vínculo de interdependência social e política; monopólio da violência pelo poder soberano co...