A doença, católica em particular

Abstract

1. Enquanto eu escrevia estas linhas, um discurso proferido pelo papa Bento XVI, em Ratisbona, em 12 de setembro de 2006, provocou grande repercussão. Porém, como é frequente o caso quando as notícias passam pelo filtro dos jornais, foi apenas sobre a parte referente à crítica da doutrina corânica deste texto importante que se lançou o foco. Muitos outros aspectos foram rapidamente esquecidos, ao menos para a opinião pública. O discurso do papa apresenta, no entanto, e de forma clara, alguns dos sinais da doença católica, e não dos menos significativos: uma volta atrás em relação ao Vaticano II, no que diz respeito à doutrina, e, no que concerne à política para com as outras fés religiosas, o retorno à situação anterior a João Paulo II. Voltarei a alguns desses aspectos para esclarecer uma das doenças cristãs, aquela que mais repercute politicamente nos países católicos. Se a ideia tinha sido falar da doença cristã, de modo genérico, nós precisaríamos voltar muito mais atrás e investigar, desde as origens, uma unidade cristã doente, o que teria sido se aventurar de um modo insensato. De resto, uma história bimilenar destruiu há muito e muito tempo essa unidade, desenvolvendo numerosos cristianismos. Trata-se, portanto, ao meu ver, antes de se interrogar com mais precisão sobre as razões profundas e específicas que levaram o mundo cristão a se fraturar em numerosas religiões, distintas e antagônicas. Falarei aqui de uma dessas razões: a relação entre vida religiosa e vida política enquanto causa fundamental das expressões díspares que o cristianismo assume nos mundos católico, protestante e ortodoxo.Vejamos, pois, algumas coisas que foram ditas em Ratisbona pelo papa Ratzinger, por ocasião do seu discurso "Fé, razão e universidade. Lembranças e reflexões". 1O documento afirma que há, no catolicismo, uma fusão entre a razão da tradição grega e a fé da tradição cristã, e polemiza contra aqueles que sustentam que "Deus é absolutamente transcendente" e que "Sua vontade não está ligada a nenhuma das nossas categorias, incluindo a da razoabilidade". E acrescenta: "Começou com Dans Escoto a teoria do voluntarismo que, em seus desdobramentos posteriores, havia de levar à afirmação segundo a qual, de Deus, só conheceremos a voluntas ordinata [...], posições que podem ser aproximadas às de Ibn Hazm e tender para a imagem de um Deus-Árbitro, que não está mais ligado nem à verdade nem ao bem". Não é difícil perceber, por detrás dessas imagens, uma polêmica não somente com o Islã, mas também com todas as concepções que apresentam Deus como imperscrutável, 2 na tradição judaica, ou ainda na tradição protestante do Deus absconditus. O ataque mais explícito, no entanto, é aquele dirigido contra o Islã, através de uma citação do imperador bizantino Manuel II Paleólogo, que disse o seguinte ao erudito persa com quem travava uma discussão: "Mostrame o que Maomé trouxe de novo. Apenas encontrarás coisas más e desumanas, como a sua diretiva de espalhar com a espada a fé que pregava". A edição da 7 a Controvérsia citada pelo papa é a ...

"O eterno fascismo italiano" e a resistência dos romances de Ignazio Silone, Carlo Levi e Vasco Pratolini

“…Declarava sua consciência da reelaboração dos fatos descritos, pois desenvolvera "com o auxílio da memória, não apenas os acontecimentos do passado, mas também a contemporaneidade infinita e poética dos tempos e dos destinos". 26 Em seu "rifugio alla morte feroce" em 1943-1944 a memória dos anos de 1935-1936 se tornava uma forma de enfrentamento da matéria trágica, caótica e catastrófica que se punha diante do escritor. O livro era uma defesa confessa, mas cerca de trinta anos depois do vivido o autor ainda pode concluir que o momento da escrita também havia sido uma forma de reviver o outro "eu", aquele que descobrira "a história além da história, o tempo fora do tempo, a dor antes de nada mais, e a si mesmo" 27 por meio da reformulação da experiência que o levou à Lucania.…”