Práticas de Psicólogos na Estratégia Saúde da Família: Poder Simbólico e Autonomia Profissional

Abstract

Resumo Este estudo, orientado pelo enfoque qualitativo de pesquisa social em saúde, discute a inserção de psicólogos nos serviços de atenção primária do Sistema Único de Saúde, por meio da Estratégia Saúde da Família (ESF). O objetivo do trabalho é analisar especificidades da atuação dos psicólogos nos referidos serviços, focalizando nas práticas desenvolvidas visando ao reconhecimento e à autonomia profissional. A técnica empregada para a construção do material empírico foi a entrevista semiestruturada, junto a 18 psicólogos com ampla experiência na atenção e formação para a ESF. O referencial teórico adotado se orienta pelos conceitos de poder simbólico e habitus, centrais na sociologia de Pierre Bourdieu. Também são retomados elementos teóricos procedentes da sociologia das profissões. Como resultados, evidenciam-se tensões concernentes às lutas por autonomia profissional. Um habitus profissional se apresenta como ilustrativo das práticas ditas específicas e distintivas do psicólogo: o saber lidar com conflitos interpessoais; ser agente problematizador e mediador nas relações interprofissionais; e a capacidade de reconhecer processos históricos constituintes das subjetividades e tramas relacionais. Alguns desafios à autonomia profissional são identificados: a expectativa social e o prestígio associados aos modelos clássicos de atuação clínica; o acolhimento de uma sobrecarga de trabalho em territórios de grande extensão; e a necessidade de elaborar posicionamentos que façam contraponto e complemento ao modelo biomédico.

Comportamentos de voz e silêncio de estudantes universitárias em estágios curriculares

“…Esse resultado descreve um contexto de trabalho em saúde no qual o silêncio parece se constituir por práticas profissionais permeadas por relações de poder, que compõem contextos de trabalho hierarquizados e conflituosos (Nepomuceno et al, 2021). Nesses cenários, a Psicologia se envolve em negociações que levam a ocupação de espaços contraditórios de prestígio e submissão.…”

A importância dos profissionais de Psicologia na Estratégia Saúde da Família: a experiência de uma psicóloga residente

“…2,3,4,5 Embora seja inegável o contexto de lutas e negociações pertinentes à construção social das práticas profissionais do psicólogo na ESF, é possível constatar uma vinculação entre a psicologia e a "subjetividade", produzindo algum reconhecimento profissional e legitimidade social. 17 A atuação do psicólogo, portanto, está voltada para a subjetividade: busca perceber o sujeito nas suas relações e percepções sobre si no mundo. Desta forma, os psicólogos tentam trabalhar com foco nas necessidades percebidas, por meio do cuidado humanizado, característico da APS, dando ênfase aos aspectos psicológicos e sociais do processo saúde-doença.…”

“…A autonomia depende de alguns fatores, um deles é o acesso à informação, visto que, é a partir da compreensão dos fenômenos vividos que o processo de interpretação crítica da realidade passa a ser percebido e praticado. 25 Assim, considerando que o leque de ações possíveis depende da estrutura e das "brechas" encontradas na organização da ESF, 17 destaca-se que todas as propostas de cuidado relatadas foram realizadas por meio do trabalho intersetorial, com a participação de outros setores responsáveis pela execução de políticas públicas, como a assistência social e a educação. As intervenções tiveram como base a Portaria nº 3.088, 26 de dezembro de 2011, que institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, que destaca a relevância do PTS no processo de cuidado dos sujeitos, e a Portaria nº 2.436, 27 de 21 de setembro de 2017, que aprova a Política Nacional de Atenção Básica e prevê a realização de consultas compartilhadas.…”

“…Pode-se considerar que existe um paradoxo da prática psicológica na ESF que dificulta o reconhecimento e conquista de autonomia deste profissional: por um lado, ocupando o lugar de "especialista em subjetividade", muito requisitado diante das lacunas, num cenário de hegemonia biomédica, por outro, convocado, pela singularidade de seu "objeto", a desconstruir engessamentos "especialismos" e promover processos criativos no cuidado em saúde. 17 Com base no princípio da integralidade, busca-se trazer o sujeito para o centro do cuidado, corroborando a proposta de cuidado amplo e contextualizado. 1 Porém, por vezes, o cuidado se configura como uma prática descontínua, seja pela falta de sensibilidade ou de habilidades que parte dos profissionais demonstram, diante da subjetividade manifesta pelo sujeito a ser cuidado, ou pelos processos de trabalho fragmentados, que dão continuidade a um modelo de saúde que enfatiza indivíduos mecânicos, como engrenagens que precisam de conserto.…”

Indicadores do atendimento psicológico no ambulatório do Sistema Único de Saúde: Um estudo de caso

“…Estudos versam a atuação de psicólogos no SUS e indicam a predominância de práticas baseadas no modelo de atendimento particular, sem considerar a adequação entre expectativas, necessidades dos pacientes e a oferta de cuidado no SUS (Amaral & Escóssia, 2021;Cintra & Bernardo, 2017;Ferreira, 2010;Jimenez, 2011;Lima, 2005;Macedo & Dimenstein, 2011;Medeiros, 2020;Nepomuceno et al, 2021;Souza & Mendonça, 2020.). Esta abordagem tradicional, clássica e privada, negligencia outras possíveis ferramentas teóricas e técnicas mais adequadas, além de levar a críticas para a atuação do psicólogo no SUS (Souza & Mendonça, 2020).…”