Resumo: Neste artigo revisitamos um tema que atravessa a etnologia guarani desde o trabalho inaugural de Nimuendaju: a interpretação dos movimentos territoriais guarani enquanto busca da terra sem mal. O texto perpassa, sem pretensão de uma revisão sistemá ca, abordagens clássicas da religião e das migrações guarani ou tupi-guarani, colocando em questão hipóteses como a da busca (profé ca ou ascé ca) como mo vação única e constante para as migrações guarani ou tupi-guarani ao longo de cinco séculos; da anterioridade à Conquista das migrações e do mo vo mí coreligioso, o que atestaria uma originalidade da cultura/religião na vas; da cultura como experiência cuja "auten cidade" dependeria de manter-se igual a si mesma integralmente ou pela permanência de uma espécie de núcleo duro. Na crí ca a estas hipóteses, o ar go aponta, par cularmente, os limites da etnologia quando esta se esquiva de uma crí ca das fontes documentais, construindo interpretações baseadas em generalizações descuidadas ou afirmações de posições ideológicas. Seguindo a trilha indicada por Bartomeu Melià acerca de uma necessária garimpagem "arqueológica" das fontes documentais para compreender os contextos vividos por grupos guarani coloniais, apresentamos um exercício analí co sobre alguns deslocamentos na primeira metade do século XVII. A análise dessas fontes lança luz sobre os deslocamentos ocorridos nas regiões do Guairá e Tapé em busca de proteção contra os ataques de bandeirantes e nos afasta da tese do mo vo mí co-profé co como tema central. Nossa expecta va é de que este exercício contribua para o desenvolvimento de uma etnologia guarani disposta a refl e r com a história e sob a crí ca das fontes documentais. Palavras-chave: Guarani; deslocamentos; terra sem mal; fontes documentais.