No presente artigo identificamos uma compreensão da ironia que é comum ao primeiro-romântico alemão Friedrich Schlegel e ao crítico Paul de Man. Nessa linhagem, a ironia é entendida antes como tropo e performance do que como conceito, o que tem consequências para a própria legibilidade do discurso.Que tipo de relação com o mundo é estabelecida pela ironia? Que tipo de discurso é a própria ironia? É possível definir a ironia em conceito? Quais as consequências do discurso irônico para o processo de compreensão? O pensamento do filólogo, filósofo e crítico Friedrich Schlegel, o articulador teórico do Primeiro Romantismo Alemão (Frühromantik), é um marco extremamente produtivo para o pensamento sobre o fenômeno da ironia. No século XX, Paul de Man será o responsável pela apropriação e divulgação (por vezes, indireta) do pensamento de Schlegel sobre a ironia, como também do seu próprio estilo "irônico". A obra de Schlegel, principalmente do Schlegel dos anos de Jena e da revista Athenäum, oferece ainda hoje elementos catalisadores para o pensamento sobre linguagem e representação, os quais, na perspectiva de De Man, associam-se ao pensamento pós-estruturalista. Assim, sob o crivo da história da literatura e da literatura comparada, o fenômeno da ironia emerge como elemento significativo na instauração do pensamento contemporâneo sobre a linguagem.É prudente estabelecer o pressuposto de que ao se tratar da ironia schlegeliana, a referência imediata é o ensaio Über die Unverständlichkeit [Da ininteligibilidade] de 1800. O ÜdU, como se passa a nomear o texto, é aqui entendido não como um discurso sobre a ironia, mas sim como manifestação do fenômeno, para utilizar uma oposição apontada por Kierkegaard, e não do conceito. Publicado no terceiro e último número da revista Athenäum, interrompida devido aos baixos lucros decorrentes de sua alegada "ininteligibilidade", o ensaio aponta assim para uma espécie de defesa de F. Schlegel, ou de autoexplicação, frente às queixas quanto a serem seus textos incompreensíveis, *