Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., IV, 3, Delírio, fantasia e devaneio: sobre a função da vida imaginativa na teoria psicanalítica* Não tive, é claro, a pretensão de esgotar todas estas questões, mas sim tornar mais claras algumas fronteiras e também pontos de contato entre os conceitos de delírio, fantasia e devaneio. Considerei, para isto, aspectos da neurose e da psicose, de forma a evitar o uso indiscriminado de conceitos que acabam, muitas vezes, sendo confundidos entre si.Para melhor explicitar os mecanismos envolvidos nos fenômenos de delírio, fantasia e devaneio, baseei-me nos casos clínicos de Freud que, acredito, melhor elucidam estes conceitos. São eles o "Homem dos ratos", o "Caso Schreber" e a "'Gradiva' de Jensen", além do artigo de 1919, "Uma criança é espancada". O "Homem dos ratos" e o "Caso Schreber" serão relacionados ao delírio na neurose e na psicose, respectivamente, e a "'Gradiva' de Jensen", por sua vez, será discutida no capítulo sobre devaneio. Já o material utilizado para a discussão do capítulo "Fantasia" será o artigo "Uma criança é espancada", que, mesmo não constituindo um caso clínico específico como os demais, será utilizado como o artigo de referência deste capítulo por sua extrema relevância com relação ao tema. O delírio na neurose e na psicoseAnalisaremos aqui o modo como a psicanálise compreende o fenômeno do delírio em formações patológicas neuróticas e psicóticas.Freud (1924) assim descreve a diferença estrutural entre a neurose e a psicose: "... a neurose é o resultado de um conflito entre o ego e o id, ao 69 ARTIGOS passo que a psicose é o desfecho análogo de um distúrbio semelhante nas relações entre o ego e o mundo externo". Esta definição é desenvolvida a partir da idéia de conflito e de defesa, segundo a qual o conflito se daria entre duas instâncias (ego x id ou ego x mundo externo), ao passo que a defesa seria investida contra as representações intoleráveis: recalque (Verdrangung) e rejeição (Ververfung).Tal definição apresenta as duas grandes estruturas psíquicas dentro das quais pretende-se, neste estudo, destacar a função exercida pelo delírio, bem como suas semelhanças e diferenças fundamentais.A neurose é compreendida pela psicanálise como tendo origem na luta do ego por manter afastado, recalcado, neutralizado, "soterrado" (para fazer uma alusão à "Gradiva") no id, um poderoso impulso dele proveniente, e que seja inaceitável pelas instâncias do ego e do superego (princípio de realidade). Em tal caso, o ego utilizase do mecanismo de recalque para defender-se deste impulso que, por sua vez, "luta contra esse destino" (Freud, 1924), criando caminhos (representações substitutivas) que se impõem ao ego mediante uma conciliação, e que constituem o sintoma. Sentindo-se ameaçado e prejudicado por ele, o ego continua a lutar contra o sintoma, tal como fez anteriormente contra o impulso. Este mecanismo constitui o quadro da neurose.O que é essencial para a compreensão do fenômeno do delírio numa neurose é o conceito a ela diretamente ligado do recalque e, mais especificam...
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