Poucos documentários tiveram o sucesso e a fortuna crítica de Paris Is Burning, de Jennie LIVINGSTON (2005 [1990). Relatos das exibições do filme, mesmo nos primeiros dias do seu lançamento, descrevem filas longas, ingressos esgotados, sessões extras e comentários efusivos dentro e fora da sala de cinema. O filme retrata os bailes organizados no bairro do Harlem, em Nova York, durante os anos 80, e seus participantes, jovens queer negros e latinos, chamados de "children", 1 que competem entre si em desfiles de diversas 1 Este artigo não pretende comparar as categorias de sexualidade e gênero do Brasil e dos Estados Unidos, mas considero relevante mencionar sua existência. No contexto estadunidense, "drag-queens" e transexuais são categorias operantes, ou seja, homens e mulheres que produzem a ilusão de feminilidade exagerada no contexto de apresentações artísticas e pessoas que não se identificam com o gênero designado a elas no nascimento, respectivamente. Como nos Estados Unidos não há a tradição de cross-dressing no contexto do Carnaval que há no Brasil, historicamente, drag, queen foi muitas vezes confundido com homossexualidade. Esta aproximação errônea foi desfeita no final dos anos 70, por trabalhos pioneiros como a etnografia dos shows de drag desenvolvida por Esther NEWTON (1979). Para uma discussão sobre "drag-queens" e crossdressing nos Estados Unidos, ver Marjorie B. GARBER (1992 RAQUEL PARRINE categorias, numa boate chamada Paris Is Burning. A cultura dos bailes nos Estados Unidos tem uma origem indefinida, mas sua versão contemporânea se caracteriza como a community and network of Black and Latina/o women, men, and transgender women and men who are lesbian gay, bisexual, straight, and queer. The Black and Latina/o queer members of this community use performance to create an alternative discursive terrain and a kinship structure that critiques and revises dominant notions of gender, sexuality, family and community (Marlon M. BAILEY, 2011, p. 367). 2A cultura de afeto a que Bailey se refere é o sistema de casas, em que jovens queer, muitas vezes rejeitados por suas famílias biológicas, encontram refúgio e reconhecimento em outras pessoas queer que lhes acolhem, adotando um sobrenome em comum e criando relações de parentesco. A casa tem uma mãe que a coordena e rege, além de filhos que, juntos, participam competitivamente dos bailes em diferentes categorias. As casas mais proeminentes no documentário são a Xtravaganza, 3 La Beija, Ninja, Saint Laurent e Pendavis. O filme alterna cenas efusivas das performances no baile com depoimentos de novatos e veteranos que explicam ao expectador a complexa história e formulação de sua comunidade. A edição organiza essas explicações em partes separadas por placas de fundo preto e letras brancas que exibem conceitos e vernáculos importantes para o entendimento da cultura dos bailes, como Houses [Casas], Ball [Baile], Shade, Realness, Reading etc. Neste formato, apresenta também a história da carreira de seus protagonistas -entre eles, Peper La Beija, Octavia San ...
Resumo Em "A causa secreta", Machado de Assis narra a amizade de dois homens, Fortunato e Garcia, marcada por encontros fortuitos e um cenário de adultério e violência. A fortuna crítica em volta do conto desafia a revelação apresentada pelo narrador e mostra horizontes não contemplados pela mente do analista: Paul Dixon ressalta a função do olhar que recai sobre os eventos; Abel Barros Baptista se debruça sobre o papel do analista; Silviano Santiago desconfia das verdadeiras motivações dos encontros fortuitos; Baptista, outra vez, relaciona a arbitrariedade da solução do relato com a arbitrariedade da construção do conto; e Eliane Robert Moraes investiga as conexões entre a prosa machadiana e a do Marquês de Sade. Esse movimento de desconfiança mimetiza a crise do narrador em geral, e a do narrador machadiano em particular, mas também aponta para o segredo da alteridade.
RESUMO:Por meio da interpretação dos recursos estéticos usados no conto "Detectives", de 1997, do escritor chileno Roberto Bolaño, observa-se como o estatuto de ficção do relato, com traços profundos de uma escritura autobiográfica, problematiza os limites entre ficção e não-ficção a ponto de tornar-se uma questão estrutural para a leitura do texto. A partir de um paralelismo com outros textos do autor e de pensamentos sobre a teoria do conto contemporâneo, podemos ou não pensar nessa ambiguidade estrutural como um novo entendimento sobre os rumos da escritura contemporânea. A literatura contemporânea estaria acabando com o paradigma da literatura, ou sua rebeldia contra seu campo é parte constitutiva do conceito que denominamos literatura? PALAVRAS-CHAVE: Roberto Bolaño, autobiografia, teoria do conto.Abstract: By an interpretation of the aesthetics resources used by Roberto Bolaño in his short history "Detectives", we seek its fictional status, as it contains strong traces of autobiographical motifs -so much as to become a crucial point for its reading. From a comparative analysis of other passages with the same motifs in other Bolaño's texts, and new forms of thinking the contemporary literature, we can pose a question of what contemporary texts are coming to be in this new century. Is contemporary literature breaking the whole paradigm of literature itself, or this rebellion against its own field is a constitutive part of the institution we came to call literature? KEYWORDS: Roberto Bolaño, autobiography, theory of the short-story."Detectives" é um dos contos da coletânea Llamadas Telefónicas, publicada em 1997 pelo escritor chileno 2 Roberto Bolaño. O livro, composto de catorze contos, é dividido em três partes: "Detectives" faz parte da segunda, de mesmo nome. Este artigo propõe uma interpretação do conto, tendo em primeiro plano um questionamento sobre seu estatuto ficcional, na medida em que está permeado por notas autobiográficas. A característica mais marcante do livro Llamadas Telefónicas talvez seja o aparecimento recorrente de personagens e situações que figuram em obras anteriores e posteriores do autor. É um grande amálgama de histórias que, para o leitor afeiçoado a Bolaño, soarão familiares. O recurso é recorrente em toda a obra do autor: personagens pulam de um livro para outro, surgem em momentos insuspeitos, participam sutilmente de situações alheias, etc 3 . 1 Mestranda no programa de Teoria Literária e Literatura comparada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Contato: raquel.santana@usp.br. 2 A questão da nacionalidade é um tema extenso quando pensado na figura de Bolaño. Por ter saído do Chile ainda adolescente, para morar na Cidade do México com os pais e suas consecutivas mudanças, e por isso ter se declarado, sempre que perguntado, como "latino-americano". Além disso, suas críticas, em seu estilo ácido, à relação do Chile com seus escritores pode ser vista em muitas entrevistas e em seus artigos reunidos no volume Entre Paréntesis. Entretant...
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