Se existir algo como uma Formação da Pintura Brasileira, os autores estão convencidos de que uma de suas chaves pode ser encontrada na solução que Gilda de Mello e Souza deu ao problema da representação do "homem brasileiro" nas telas regionalistas de Almeida Júnior
Nem tudo que é sólido desmancha no ar PA ULO EDUARDO ARANTESC OMO A MAIS ABSOLUTA dominação sobre os homens continua a ser exercida por meio de processos econômicos de exploração -mesmo sobre a crescente parcela da humanidade que está sendo rifada precisamente porque deixou de ser economicamente rentável -, o Manifesto Comunista ainda cruzará o milênio como uma mensagem na garrafa. Muito mais atual inclusive do que há 150 anos, quando a proletarização dos pobres e demais expropriados ainda não parecia irreversível, a ponto de considerável número deles procurar escapar à danação do assalariamento -só viver se encontrar trabalho, e só encontrar trabalho se este incrementar o valor do capital -reagrupando-se à margem da ordem burguesa nascente na forma de comunidades cooperativas, por meio das quais sonhavam recuperar a antiga independência econômica perdida. Porém a Modernidade anunciada pelo Manifesto viera também para abortar o não-lugar dessa utopia. Com a atual mundialização do capital enfim, ninguém mais está fora, sobretudo as grandes massas precarizadas e desconectadas na corrida ao corte de custos: em tempos de pressões competitivas globalizadas, literalmente não têm mais para onde ir. Nunca estiveram tão irremediavelmente incluídas.
Este livro se insere, explicitamente, como atesta seu subtítulo – Estudos sobre a Formação da Cultura Filosófica Uspiana –, num esforço da nossa historiografia de reconstruir linhas evolutivas mais ou menos contínuas, isto é, num projeto que privilegia períodos de formação. Nesta série – que inclui, entre outros, Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Jr., e Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado –, Paulo Arantes aproxima-se mais do horizonte teórico do Antonio Candido de Formação da Literatura Brasileira, seja pelo assunto – o vir-a-ser de um sistema cultural que, superando os surtos desgarrados e as curiosidades intelectuais avulsas, estabeleceu, pelo entrelaçamento de obras e de problemas específicos, um “filtro” à oferta internacional de teoria e modelos –, ou seja pela descrição não-normativa da acumulação material da experiência intelectual por meio de uma rotina que descambou, enquanto resultado coletivo, na força produtiva histórica de uma vida filosófica efetiva. Não se trata, porém, da reconstrução histórica de um período de acumulação. Este Um Departamento Francês de Ultramar é ele próprio uma contraprova da constituição de uma continuidade filosófica no Brasil. Afinal, retoma, em suas características e delineamentos principais, de forma crítica e abrangente, o trabalho de seus predecessores (não apenas de Cruz Costa, o malogrado historiador da filosofia brasileira, mas também dos membros daquela geração que nos anos 1960 completou o ciclo formativo da filosofia brasileira). Arantes amplia o escopo do ensaísmo filosófico implantado entre nós por Bento Prado Jr., ao incorporar a sociologia e a história ao diálogo, proposto por este, entre literatura e filosofia, fazendo do momento expressivo – em vez de uma forma de revelação do espaço rarefeito da linguagem – um elemento indispensável da investigação, sempre mediada, de objetos já pré-formados culturalmente. Examinando a “crença na co-naturalidade entre filosofia e literatura”, Arantes desvenda não só os pressupostos da concepção de Bento Prado – a teoria de um “absoluto literário” –, como também atinge “o miolo vulnerável da Ideologia Francesa da literatura”. O mesmo fio, de dois gumes, permite que se decifre a cultura europeia, o mundial, o centro e a vida intelectual brasileira, o nacional, a periferia. Esse fio resulta – dito de forma brusca – da experiência intelectual e social brasileira, que nos induz, de certo modo, ao “sentimento da dialética”. Transposta assim para um solo histórico, reencontramos a mesma preocupação de Giannotti e Ruy Fausto acerca do significado da dialética que deu origem ao capítulo brasileiro – que Arantes com este livro, de certa forma, reinventa – do marxismo ocidental. (Ricardo Musse, orelha da versão impressa) Também disponibilizamos para download o número especial do Caderno Mais! da Folha de S.Paulo (6 de fevereiro de 1994), dedicado ao lançamento do livro, com o título "A aventura da Filosofia Paulista". Nele, Paulo é entrevistado por Fernando de Barros e Silva e Vinícius Torres Freire. Palavras-chave: Filosofia e Literatura, Cultura filosófica, USP, Missão francesa, Anos 1960, Filosofia no Brasil, Formação, Método estrutural, Jean Maugué, Víctor Goldschmitt, Martial Gueroult, Gérard Lebrun, Gilles-Gaston Granger, João Cruz Costa, Bento Prado Jr, José Arthur Giannotti, Oswaldo Porchat, Ruy Fausto.
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