Decorrente de uma dissertação de mestrado em Filosofia na PUC-Pr, o livro de Vilmar Debona tem prefácio de Maria Lúcia Cacciola e apresentação de Jair Barboza. no decorrer de cinco capítulos, o autor aborda de forma clara e abrangente os principais aspectos da razão ao longo da obra de Arthur Schopenhauer, com o objetivo de questionar a soberania da Vontade num pensamento voltado para o irracional. Debona enfatiza três formas da razão: a teórica (referida ao conhecimento abstrato), a prática (própria da sabedoria de vida) e a ético-mística (ligada ao nirvana budista da negação da Vontade), todas identificadas a partir de uma interpretação original do pensamento do filósofo que se auto-intitulava "o autêntico discípulo de kant". A principal hipótese desenvolvida pelo autor é a de que mesmo no momento limite de renúncia à Vontade há indícios da atuação da razão, uma vez que, até ao mirar o nada, o asceta está motivado por algo que preserva sua condição.no primeiro capítulo são descritas as bases do conhecimento dos fenômenos, ressaltando-se, além da função da razão teórica, o papel crucial do corpo nesse processo. Segundo Schopenhauer, o entendimento é anterior à razão, posto que é uma faculdade intuitiva e imediata, e que fornece o conhecimento da efetividade do mundo por meio das relações de causalidade. A razão teórica, por sua vez, é secundária e apenas produz conceitos. Mas, apesar das diferenças, entendimento e razão se relacionam no processo de conhecimento, já que, conforme o filósofo, o mundo é representado a partir do RESENHA * Doutoranda em Filosofia/UFMG. Resenha recebida em 10/12/2011 e aceita em 4/1/2012.
O presente artigo tem por objetivo demonstrar a participação fundamental do corpo na ética de Schopenhauer. Tomando-se como ponto de partida o mundo como representação, o corpo é a objetidade da Vontade, seu modo mais imediato de se manifestar no mundo. Mas, por outro lado, analisando-se o mundo na perspectiva da Vontade, o corpo é a própria Vontade, experienciada e vivida por meio dos próprios motivos que regem esse objeto desejante. Ao postular a Vontade, una e imperecível, como fundo último da realidade, como faz Schopenhauer, não há como desconsiderar o corpo e o sofrimento humano. E isso não é sem consequências para a ética. Segundo o filósofo, a mesma não reside em boas intenções e nem na busca de algum bem espiritual ou transcendente, mas existe concretamente nas ações efetivas dos indivíduos, que se dirigem aos outros indivíduos, percebidos antes de tudo, como corpos padecentes.
Resumo: Este escrito sintetiza nossa pesquisa de doutorado. A mesma não é uma análise exegética das teorias de Schopenhauer e de Freud, mas busca comprovar e justificar a existência de uma problemática fundante e comum a ambos: responder ao enigma imposto pelo corpo e suas implicações para a ética. O nosso objetivo é, pois, investigar o corpo e as consequências éticas oriundas da abordagem desse objeto por nossos autores. O corpo não é apenas um objeto de ciência, mas carrega uma dimensão irredutível do homem para ambos. Optamos por entrelaçar, ao longo do texto, as concepções do corpo nos dois autores, ressaltando algumas semelhanças e diferenças que nos permitem dizer do estatuto ético desse objeto nas obras do filósofo e do psicanalista. Palavras-chave: Schopenhauer; metafísica da vontade; Freud; metapsicologia; corpo; ética da compaixão. Abstract:This writing is a synthesis of our doctoral research, which is not an exegetical analysis of Freud's and Schopenhauer's theories. It is rather an attempt to prove and justify the existence of a group of problems which is founding and common to both thinkers: how to answer to the enigma of the body and what are its ethical implications? Our goal is therefore to investigate the body and the ethical consequences from the approach of this object by our authors. The body is not just an object of science, but holds an irreducible dimension of men. We chose to link body concepts in the two authors throughout the text, pointing out some similarities and differences that allow us to explain the ethical status of this object in the work of the philosopher and the psychoanalyst. Keywords: Schopenahuer; Methaphysis of the Will; Freud; Metapsychology; body; compassion ethics.Vivemos em uma época na qual o corpo ganha imensa importância cultural: por um lado, com o avanço da genética, das neurociências e da biologia molecular, o corpo é visto como um objeto físico ou como uma máquina, embora extremamente complexa e, por outro lado, ele é enaltecido como uma imagem de prazer, de beleza e de sucesso social. Sigmund Freud (1856-1939) era um médico e partilhava das concepções materialistas e cientificistas da medicina de sua época. No entanto, a experiência clínica o levou a se distanciar dessas concepções e a descobrir o corpo como encarnação de um sujeito, atravessado por imagens, afetos, memórias e linguagens. Apesar de seu ponto de partida materialista, Freud descobriu, por meio de sua conceituação metapsicológica, o corpo como representação. Ao ler o filósofo Arthur Schopenhauer (1788-1860), encontramos, na ideia basilar do "mundo como representação", a expressão filosófica dessa descoberta. Aquilo que Freud só alcançou lentamente foi formulado pelo filósofo, que partiu do idealismo kantiano. Essa pista nos ajudou a ler Freud tomando distância do fisicalismo, não só típico de sua mentalidade médica, mas que ainda hoje é a concepção dominante. O que significa, em termos psicanalíticos, a ideia do corpo como representação? Significa que o corpo não é apenas um objeto físico, porqu...
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