Há cartas que não guardam apenas recados, doenças do fígado, frases bem feitas, há cartas que captam instantes fugidios, fases específicas, mudanças de rota, experiências, pontos de conversão da alma, seu gênero narrativo possibilita fixar as forças do devir de uma existência. Existem cartas de pijama, para usar uma expressão de Mário Andrade, onde as vidas se vivem e a escrita talha o papel com tinta e sangue de projetos, idéias, interesses, sensações e sentimentos, eis o caso das missivas da artista plástica paulista Anita Malfatti (1889Malfatti ( -1964, da musicóloga e folclorista Oneyda Alvarenga e da poetisa mineira Henriqueta Lisboa endereçadas ao escritor Mário de Andrade (1893-1945) nos idos dos anos 1920 até meados da década de 1940.Essas missivas guardam em primeira mão a imediatez das sensações e as circunstâncias em que se enredaram as amizades tecidas entre o escritor
Considerada virtude cardinal nas sociedades antigas e modalidade ideal de relação com o outro, a amizade, contemporaneamente, não possui o mesmo prestígio de outrora. Esta tese pretende recuperar a discussão sobre o tema, sublinhando a importância da presença da mulher nesse vínculo intersubjetivo.Ademais, reflete sobre as formas de construção da subjetividade feminina realizadas fora dos espaços institucionais carregados de peso social como a família, a escola e o casamento. Neste trabalho, aproximo-me das relações de amizade na modernidade brasileira, mediante as cartas trocadas entre Anita Malfatti, Oneyda Alvarenga, Henriqueta Lisboa e o escritor Mário de Andrade, mais especificamente, nos idos dos anos vinte e meados da década de quarenta. Nas missivas, essas intelectuais-artistas esculpiram retratos singulares de si mesmas, apontando o caráter ético e estético de um sujeito que se fabrica no espaço dialógico das correspondências.
Oneyda Alvarenga's letters addressed to the writer Mário de Andrade are here considerer as memory-objects and relic-objects, endowed with the ability to revive the relationship of education, work and friendship by which they were united. Moreover, these letters are literary documents of a writing of itself, in the meaning suggested by Michel Foucault, by which individuals are able to build images of themselves. In this work, I have approached the poetic of itself formulated by Oneyda Alvarenga in the intersubjective networks of friendship and letter writing with Andrade. Their letters were read as documents, which retain a literature of themselves. This literature can be considered as transgressive as the literature that sought to overcome the limits of language. In the letter writing of Oneyda Alvarenga, this actually meant to overcome the limits of herself and to (re) build herself in and by the action of daily writing.
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