Toda análise é trespassada, inevitavelmente, pela contratransferência. Esse fenômeno constitui-se numa das questões fundamentais e mais problemáticas da teoria e técnica psicanalíticas, pois afeta o analista no cotidiano de sua clínica e o remete à sua análise pessoal, supervisão e escrita clínica, tal a angústia em face da inquietante estranheza da transferência. Denotada sua importância, neste texto será trabalhada a construção do seu conceito em Sigmund Freud como experiência necessária, mas um problema a ser resolvido, em Sándor Ferenczi, que aproxima a contratransferência como parte inerente da relação transferencial e da técnica analítica, e em sua posterior releitura por Paula Heimann em 1950, que demarca a importante mudança na compreensão do termo como ferramenta essencial ao método analítico.
Este artigo discute o início da relação analítica com crianças autistas à luz da análise de Maria, uma criança autista de três anos de idade. O caso clínico de Maria tornou-se importante como objeto de estudo, por ter suscitado um questionamento dos princípios teórico-clínicos que induzem o psicanalista a encontrar significados nas ações de uma criança autista, mesmo quando ela não fala e não brinca, e a interpretá-los, desde o início de uma relação analítica, com o intuito de criar a relação transferencial. Com Maria, a analista, no início do tratamento, deixou em suspenso os significados e as interpretações e passou a vivenciar a natureza fenomenal dos “grunhidos” e “maneirismos” da criança. Ao proceder dessa forma, abriu-se uma outra via para se criar uma relação analítica com Maria: as várias tonalidades e ritmos dos seus “grunhidos”, o zumbido de seus “maneirismos”, as formas dos seus movimentos corporais e o ritmo da sua respiração, passaram a ser contidos pela analista em seu próprio corpo, contudo, esse material clínico não foi interpretado no início do tratamento de Maria.
Este artigo reflete sobre a pesquisa e a escrita em psicanálise na universidade. São desenvolvidas reflexões críticas sobre o método psicanalítico no cenário acadêmico, as estratégias metodológicas de pesquisa em psicanálise, o lugar do analista-pesquisador neste processo, e as implicações da escrita em psicanálise.
Este artigo reflete sobre a importância de pensar a relação transferencial na clínica psicanalítica para além da interpretação. Para isso, utiliza-se a concepção de Winnicott como referencial teórico, sendo ressaltadas a noção de holding, a regressão à dependência e a questão do uso de objetos e sua influência sobre a técnica da interpretação. Winnicott revela que na clínica com alguns pacientes, em especial os autistas e psicóticos, o objetivo da análise, antes de fornecer interpretações, é proporcionar um ambiente suficientemente bom a partir do qual o sujeito pode retomar o processo de constituição de si mesmo e da externalidade do mundo.
The transferencial relation beyond the interpretation: reflections from the theory of Winnicott. This article reflects about the importance of thinking the transferencial relation in the psychoanalytic clinic beyond the interpretation. For this, the Winnicott's concept is used as theoretical reference, highlighting the concept of holding, regression to dependence and the question of the use of objects and its influence on the technique of interpretation. Winnicott shows that in the clinic, with some patients, particularly autistic and psychotic, before providing interpretation, the objective of the analysis is to provide a good environment from which the subject can retake the constitution process of himself/herself and of the externality of the world.
ResumoO artigo reflete a relação transferencial na clínica psicanalítica com crianças autistas. Verifica-se que, a partir do trabalho de Melanie Klein (1930), a análise da transferência com crianças autistas é realizada por meio de interpretações verbais e o lugar do analista é o de intérprete. A partir do pensamento de Winnicott, o analista ganha outro lugar na situação transferencial com a criança autista para além da função de intérprete. Dentre as ideias de Winnicott, enfatiza-se a questão do holding e da interpretação, o modelo da "mãe suficientemente boa" como um norteador da transferência e a importância dos vínculos sensoriais não-verbais na relação transferencial.Palavras-chave: transferência, interpretação, holding, autismo. AbstRActTransferential relation with autistic children: a contribution from Winnicott's approach Klein (1930), the analysis of transference with autistic children is carried out through verbal interpretations and the place of the analyst is that of an interpreter. From the thought of Winnicott, the analyst gains ano- This article reflects about the transferential relation in the psychoanalytic clinic with autistic children. It is verified that, from the work of Melanie
RESUMOO foco deste artigo é a transferência na clínica psicanalítica com crianças em sofrimento psí-quico grave. Reflete-se sobre a importância de pensar a relação transferencial para além da interpretação e a importância dos vínculos sensoriais não-verbais no manejo da transferência. Utilizando como referencial teórico e clínico as idéias de Winnicott, relata-se a evolução da análise de uma criança que teve como característica o estabelecimento de um ambiente holding, no qual a transferência foi marcada pelo olhar e pelo corpo da analista, possibilitando a retomada do processo de constituição psíquica da criança. Descritores: transferência; sofrimento psíquico grave; interpretação; vínculos sensoriais não-verbais; holding.Ao analisar a história da clínica psicanalítica com crianças em sofrimento psíquico grave, verifica-se que o manejo da relação transferencial é realizado por meio de interpretações verbais, e que a postura básica do analista é marcada pela interpretação discursiva do comportamento da criança. Assim, o lugar do analista -herança clássica kleiniana -é o de intérprete, e o papel da analista é o de interpretar, o mais breve possível, o simbolismo revelado por de-
Palavras-chave: Autismo, auto-erotismo, prevenção, psicopatologiaNota-se que nessa descrição classificatória é estabelecida uma relação linear causal entre dois padrões comportamentais: "a tendência em estar absorto consigo mesmo" e "o desinteresse às comunicações das pessoas". Trata-se de uma conclusão no mínimo discutível. Se, por um lado, os padrões comportamentais descritos com relação aos bebês são da ordem do observável, o mesmo não se pode dizer da relação linear causal entre esses dois padrões comportamentais. A causalidade linear é atribuída pelo observador, pois, na verdade, o que é observável são os dois padrões comportamentais que podem ocorrer ao mesmo tempo ou em diferentes momentos. Por que estabelecer uma relação linear causal entre eles? Por que "estar sintonizado em suas próprias sensações e/ou fantasias" é considerado um comportamento que impede o bebê ou a criança pequena de prestar atenção às comunicações de outras pessoas?O questionamento da relação linear causal entre os dois padrões comportamentais -"estar absorto consigo mesmo" e "estar desinteressado às comunicações das pessoas" -possibilita pensar sob um outro prisma, a saber, o papel da criatividade e da imaginação do bebê nesses comportamentos. Quais as relações existentes entre "estar absorto consigo mesmo" e a capacidade do bebê e da criança pequena de "criar, imaginar e fantasiar"? O estudo das psicopatologias precoces relacionadas ao desenvolvimento da criança evidencia um ponto central da discussão sobre a relação linear causal entre "estar absorto consigo mesmo" e a "capacidade de criar, imaginar e fantasiar".
Neste artigo, discutem-se as incidências da amamentação e do desmame na constituição subjetiva do sujeito. Analisa-se também o aparecimento de uma compulsão de ingerir substâncias não alimentares em uma criança autista após o desmame. Utilizase a teoria de Klein e Lacan, compartilhando semelhanças e diferenças na constituição psíquica inicial. Conclui-se que compulsões podem aparecer como uma forma de expressar a angústia do bebê frente à perda dos objetos primordiais da organização psíquica em um tempoprecoce, mas não apenas ligadas à amamentação. Entende-se que os recursos psíquicos da criança tendem a construir defesas de repetição diante da angústia de separação.
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