O presente artigo tem como objetivo apresentar os resultados preliminares da pesquisa, que ora desenvolvo, sobre os crimes passionais atribuídos a indivíduos de ambos os sexos, ocorridos na cidade do Rio entre fins do século XIX e as três primeiras décadas do XX.1 As questões relativas à criminalidade passional têm suscitado importantes reflexões, norteadas por diferentes enfoques, entre estudiosos pertencentes aos diversos campos das chamadas ciências humanas.
2Em termos gerais, a pesquisa que venho realizando, orienta-se em dois sentidos básicos. De um lado, investigar as estratégias normatizadoras das relações afetivas e sexuais da população urbana formuladas e difundidas por médicos e juristas e, de outro, os possíveis significados dos mais variados comportamentos sexuais e afetivos vivenciados, na prática, por homens e mulheres na cidade do Rio durante o referido período. Neste sentido, o estudo em questão tem como preocupação básica avaliar e discutir as aproximações e rupturas entre os projetos e as vivências, bem como a multiplicidade de significados que perpassam as dimensões dos saberes e das práti-cas relativas à sexualidade e à afetividade, buscando-se compreender o universo das diversidades a partir das diferenças de classe, de gênero e de etnia e, portanto, das inter-relações com o contexto social mais amplo, marcado por profundas transformações.No que se refere especificamente à temática abordada, a pesquisa tem como fonte fundamental de inspiração o trabalho pioneiro Morte em Família da antropóloga Mariza Corrêa sobre as representações jurídicas dos papéis sexuais, através da análise dos processos de homicídio entre homens e mulheres, ocorridos em Campinas entre 1952 e 1972.3 Entretanto, o eixo * Versão original deste trabalho foi apresentada no VIII Encontro Regional de História da ANPUH-RJ, Vassouras, Rio de Janeiro, 13-17 de julho de 1998.Topoi, Rio de Janeiro, nº 1, pp. 153-177.