IntroduçãoO termo "memória política" remete à ideia de que todos os povos têm diferentes graus de memó-ria em relação aos acontecimentos políticos vividos. Existiriam, assim, povos com muita, pouca ou sem memória política. No entanto, a memória política da qual falamos aqui tem pouca relação com essa representação. Referimo-nos a ela como um campo de práticas cuja emergência estaria associada a processos políticos que ocorreram na segunda metade do século XX, como o fim das ditaduras militares na América Latina, o apartheid na África do Sul e a queda do Muro de Berlim (Pollok, 1992; Huyssen, 2001). Durante esse período, houve uma verdadeira virada em direção ao tema da memória, que adquiriu expressão numa diversidade de registros, como a produção cinematográfica e televisiva. Mas essa mudança também se expressou na emergência de práticas e agentes, como as vítimas, os testemunhos, os movimentos de direitos humanos, as comissões da justiça e verdade e os suportes materiais da memória, a exemplo de monumentos às vítimas do terrorismo do Estado, memoriais, eventos, livros, filmes, intervenções artís-ticas, centros de memória e outros, que no seu conjunto sugerem a conformação de um campo específico, no sentido dado por Bordieu (1983), que se diferencia tanto da memória social como do próprio campo político.Nas suas formulações clássicas sobre a memória social, Maurice Halbwachs define-a como um fenômeno sociológico que deve ser distinguido tanto da memória individual como da memória histórica. A memória social forma-se a partir de experiências vividas por grupos sociais, enquanto a memória histórica é um registro textual produzido pelo poder. A memória social articula-se com a oralidade,