ARTIGOSOs itxoí, ou grupos de praça Karajá. As organizações triádicas existem? 1 Helena Moreira Schiel (École des Hautes Études en Sciences Sociales)O texto que deu origem ao presente artigo foi escrito há quase dez anos para uma comunicação no III Encontro Macro-Jê. Naquele momento eu pretendia chamar a atenção para a proposta de Nathalie Pétesch de interpretação do universo simbólico karajá em termos da "abertura do dualismo concêntrico em uma tríade", à maneira de Lévi-Strauss, mostrando sua aplicabilidade em um caso específico (Pétesch 1987; Lévi-Strauss 1958b). Com efeito, as ideias de Pétesch haviam encontrado considerável resistência de seus pares, os karajólogos ativos de então. Além disso, o próprio modelo do dualismo já estava um tanto fora das discussões, seja por seus formalismos em excesso, seja por sua aparente pouca dinâmica. A proposta de Pétesch, entretanto, me parecia bastante eficaz na explicação de dados mais rebeldes da etnografia karajá.Desde então muita coisa mudou. A tardia publicação da versão original do presente texto e seu posterior desenvolvimento em minha dissertação (cf. [Cavalcanti-] Schiel, 2007 e 2005 contribuiu para o reconhecimento da eficácia do modelo triádico por parte dos karajólogos. Os trabalhos mais recentes não se furtam a lidar com o universo simbólico karajá em termos de triadismo, ou ternarismo (Rodrigues 2008;Nunes 2009 Nunes , 2012) -ao contrário, utilizam-no largamente. Um trabalho independente também confirma a reprodução do modelo triádico em um domínio bastante inusitado, o da distribuição musical (Brígido 2011).Não apenas o modelo triádico ressurgiu nas análises sobre os Karajá, mas a etnologia das Terras Baixas da América do Sul de modo geral apresenta um crescente reavivamento de discussões em torno dos dualismos Jê, Tupi ou Pano, por exemplo, que levam em conta uma dinâmica e uma assimetria que remetem diretamente ao "perpétuo desequilíbrio" proposto por Lévi-Strauss em A História de Lince (1993) 2 . O presente artigo é uma versão ampliada da argumentação desenvolvida no capítulo 4 de minha dissertação de mestrado, referente à vida ritual. Incorporar essas novas contribuições sobre os dualismos e assimetrias dos esquemas sócio-cosmológicos ameríndios implicaria em uma considerável revisão que não modificaria acentuadamente o que os dados karajá têm a contribuir à discussão. Dessa forma, optei por não incluir aqui os novos debates, acreditando, contudo, que o material karajá seguirá servindo de contraponto aos modelos dualistas mais clássicos, uma Campos 13(2):24-38, 2012 25 ARTIGOSOs itxoí, ou grupos de praça Karajá. As organizações triádicas existem? vez que parece corresponder exatamente à imagem formal da abertura do dualismo concêntrico. Vamos a ele.Os grupos de língua Jê do Brasil Central entraram para o "mapa" da produção antropológica em nível mundial a partir da descoberta, por Curt Nimuendaju, Robert Lowie e Claude Lévi-Strauss, na primeira metade do séc. XX, de organizações ditas dualistas entre eles. Estes grupos pareciam, aos olhos dos prime...
No encontro colonial, duas formas de relação institucionalizada, as relações de compadrio cristão e as de afinidade potencial ameríndia, encontraram uma tal semelhança que puderam traduzir-se uma na outra. Partindo de uma leitura da sugestão de Salvatore D’Onofrio de um “átomo de parentesco espiritual” para explicar o compadrio, pretendo sugerir que as duas instituições evocam o mesmo tipo de armadura sociológica. Antes que a substituição do parentesco tradicional, acredito que o parentesco espiritual tenha uma relação de sobreposição e superação dos laços familiares. Avanço a hipótese de que esse tipo de relação institucionalizada estaria na base de toda relação política.
Neste artigo pretendo demonstrar que a força que mantém aldeias grandes de forma mais perene é a produção de festas para filhos belos de famílias de prestígio, ou nobres. Acredito que este fenômeno, que é concebido pelos Karajá como a manifestação de riqueza de uma família, seja a base da manutenção de unidades políticas maiores. Para isso, procurei demonstrar que as características da chefia ameríndia, sugeridas por Pierre Clastres estão francamente corretas, mas são insuficientes para explicar a manutenção de grandes aldeias. Restaria explicar, justamente, diante de um potencial físsil tão grande, diante desta "força centrífuga" da máquina política ameríndia, como é possível o surgimento e a manutenção de aldeias grandes. Nosso argumento neste artigo é que tal é possível com a manutenção de uma vida alegre e pacífica na aldeia. Isto é possível mediante a produção contínua de festas e pelo reconhecimento público da beleza dos filhos de chefes. In this article I have the intention of showing that the strength that keeps the big villages together for the longest time is the production of festivals for beautiful children of prestigious families, the nobles. I believe that this phenomenon, conceived by the Karajá as the manifestation of the wealth of a family, is the basis for the maintenance of bigger political units. For that, I tried to demonstrate that the characteristics of the Amerindian chief, suggested by Pierre Clastres, are frankly correct, but they are insufficient to explain the maintenance of the greater villages. I would like to explain, precisely how, facing a great potential of fracture and fission, given the "centrifugal force" of the indigenous political machine, how the dawn and maintenance of larger villages is possible. My argument in this article is that it is possible through maintaining a joyful and peaceful life in the village. This is made possible through a continued production of festivals and public recognition of the beauty of the children.
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