Convocamos fragmentos de andanças de duas professoras, duas proposições de escrita em trajetos diversos que se compõem, lendo a formação como devir, abertura para novos encontros. Uma delas coloca-se um pouco à deriva, com Jack Kerouac, Suely Rolnik, clowns e mais. Outra passeia com Félix Guattari, Fernanda Eugénio e João Fiadeiro, por cidades, catando. Ambas se encontram com Agnès Varda. Territórios que se desfazem enquanto novas composições se delineiam, num processo sem fim de leituras e aberturas de mundos.
Escreve-se pela cidade, caminhando e alinhavando suas linhas aos corpos em trânsito. Caminha-se entre vegetais, minerais, percorrendo as delicadezas de tempos brutos com uma escrita-filosofia das existências mínimas. Traçando entre fissuras, frestas e corpos que (des)encontram.
Este ensaio escreve-se pela cidade, pelas marcas de quem por ela caminha. A cidade se provoca no texto: contra-diz. Cidade fértil: brota, respira, transpira. A cidade escuta a si mesma, irrompe, risca. O caminhante intervém nela produzindo paisagens, arquiteturas, meios-lugares, quedas, derivas, (in)servíveis. A cidade emaranha suas direções com encontros (im)possíveis. Com existências mínimas (LAPOUJADE, 2017), enquanto caminhar se delineia com uma prática filosófica (GROS, 2010). O caminhante, errante, vagabundo: texto em equilíbrio precário, entre os fios de uma rede (DELIGNY, 2015). Fio a fio, o caminhar e a cidade cartografam-se (ROLNIK, 2007; DELIGNY, 2015) neste texto, mapeando os trajetos vagos e os desenhos da caminhada.
Este texto traz um recorte dos processos de uma pesquisa de mestrado concluída em 2019, envolvendo a cartografia (ROLNIK, 2007) de hortas urbanas em Curitiba e a criação de modos de vida minoritários. Composições com um corpo planta que se decompõe a todo momento parecendo desvelar um flerte e abrir à criação deste inventário botânico afetivo. Fotossintetizar. Alterar formatos, bricolar. Aproximar-se dos modos de existência vegetal, numa experimentação de escrita convocando saberes outros que vêm habitar um desejo de escrita vegetal, inumana. Permeável. Disponível. E no ato de instaurar, fazer ver, autorizar existências que estão em potência de criação (LAPOUJADE, 2017). Interessam os processos de diferenciação em movimento molecular. Experimentações de estados vegetativos de escrita. Tempos vegetais. Microrganismos tomando conta de um corpo-planta-escrita e imprimindo os tons de cinza amarronado, pontos brancos e bolor.
Este texto cartografa encontros de um grupo de estudos e pesquisas em uma universidade pública. Leituras e abertura de mundos, gerando possibilidades de-formativas entre educadoras/pesquisadoras. Cartografia (ROLNIK, 2007; DELEUZE; GUATTARI, 1995) que, variando entre imprevistos, desimportâncias e aspectos comumente desconsiderados nos processos formativos, convoca outros movimentos de atenção e presença. E, também, experimentações com a escrita, que se alinhava em multiplicidade, ativando vozes e derivações. Encontros pensados como acontecimentos que produzem efeitos e convidam a desaprender (BARTHES, 1989). Deslocamentos em direção ao desconhecido. Desaprendizagens entre anotações de cadernos, conversas de corredor, danças, telas de computador, espantos, perplexidades e vizinhanças. Vivendo a educação como criação de circunstâncias (DELIGNY, 2018). Corpo coletivo produzido na ressonância dos encontros. Ao longo do tempo, os espaços se alteram, passando pela mudança de campus da universidade e posteriores efeitos pandêmicos contagiando o tecer da narrativa.
Entre o texto (BARTHES, 1988, 2003) e sua individuação (SIMONDON, 2005; DELEUZE, 1980, 1988, 2002; BARTHES, 2005; MACÉ, 2018) biografa-se o pátio da universidade, rabiscando com as cadências de quem passa. Com os deveres e as obrigações em meio às bicicletas em ziguezague. Com motores. Entre vãos. Ordens. Velocidades e lentidões. Entre braços que balançam. Rabisca-se com os espaços e tempos intersticiais de incerta heterotopia (FOUCAULT, 2013) delimitada por um retângulo aberto, o pátio. As câmeras de segurança testemunham o escoamento do tempo enquanto as linhas carregam flores, varrem o chão, flutuam com balões vermelhos, planam pássaros, protestam e julgam com as gentes. Nem mesmo os cães a atravessar o pátio, entre faixas e cartazes, escapam do rabiscado.
scite is a Brooklyn-based organization that helps researchers better discover and understand research articles through Smart Citations–citations that display the context of the citation and describe whether the article provides supporting or contrasting evidence. scite is used by students and researchers from around the world and is funded in part by the National Science Foundation and the National Institute on Drug Abuse of the National Institutes of Health.
hi@scite.ai
10624 S. Eastern Ave., Ste. A-614
Henderson, NV 89052, USA
Copyright © 2024 scite LLC. All rights reserved.
Made with 💙 for researchers
Part of the Research Solutions Family.