Descrevo a rotina da comunidade de Paracatu de Baixo, em Mariana, Minas Gerais, atingida pelo rompimento da barragem de rejeitos minerais de Fundão, em 2015. Os moradores foram deslocados compulsoriamente da zona rural para a sede municipal, sem a possiblidade de desempenhar seus modos de vida caracterizados, especialmente, pelo trabalho na roça. Meu argumento é que o cotidiano não foi restabelecido após o desastre, sendo que a rotina é marcada pelo extraordinário. A partir da pesquisa de campo, analiso a categoria ‘atingido’ e as reuniões com a assessoria técnica e com os representantes das mineradoras responsáveis pelo desastre. Por fim, mostro algumas estratégias dos moradores para lidarem com o tempo dissociado da terra natal.
O objetivo deste artigo é descrever como a vulnerabilidade das(os) atingidas(os) pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, foi intensificada com o rompimento da barragem B1, em Brumadinho. A partir de pesquisa de campo realizada com a comunidade de Paracatu de Baixo, verifiquei como a rotina foi alterada por outro desastre em Minas Gerais. Meu argumento é que mesmo a lama de rejeitos não alcançando o município de Mariana, os moradores foram perturbados novamente. Um desastre remete ao outro, na medida em que os moradores acionam a memória para compor narrativas do trauma. Seguindo os relatos das(os) atingidas(os) usados em minha etnografia, proponho uma ampliação da noção de “ser atingido”, considerando o tempo como eixo para pensar as transformações na rotina e os impedimentos das formas de viver. Concluo que a noção abrangente e contígua de atingido é fundamental na construção das lutas e das reivindicações das comunidades atingidas pela mineração.
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