Navarra, século xvi. O licenciado Lombera, um dos encarregados no caso dos bruxos do vale navarro de Arraiz, informa em 1527, que «nos negócios de bruxos e bruxas, houve alguma dilação ... E nos pareceu que não debe ser tratado por hora pelo Santo Oficio». Estranha opinião em um momento que tribunais religiosos e laicos esquadrinham as comunidades por toda a Europa, à caça dos mais temíveis inimigos do rebanho cristão: os seguidores do Demónio.
Publicado há dez anos na Inglaterra, Religião e o Declínio da Magia de Keith Thomas veio, ainda que tardiamente, preencher uma imensa lacuna bibliográfica. Essencialmente um livro sobre o marginal, daquilo que foi por muito tempo uma "zona cinzenta" dos estudos históricos, constitui um esforço de arqueólogo: mergulhar nas sombras da Modernidade e procurar decifrar o universo das crenças mágicas em suas relações com a ortodoxia dominante. Na perspectiva de Thomas, Religião, Magia e outros termos correlatos, não se encontram claramente definidos, mesmo em suas interrelações com outras crenças, o que abre espaço às inquietudes do leitor em relação a aspectos específicos, sem que seja necessário comungar com as interpretações propostas para os mesmos. Crenças religiosas e mágicas (màgico-religiosas?), aparecem, pelos testemunhos de juizes, astrólogos, pastores e confissões, em sua real dimensão: a angústia cotidiana frente à crueza do ambiente e sua impotência de superação da realidade à qual-desgraça das desgraças!-a Reforma acrescentará uma nova crueldade-a demonstração da impossibilidade humana de contar com o tradicional apoio de santos, relíquias, anjos da guarda, enfim, toda uma possibilidade de intervenção divina imediata, que pelo menos, confortava psiquicamente a perplexidade humana frente às contingências do viver. Nesta obra, não é exatamente o título que desvenda o seu real conteúdo, mas seu subtítulo original: "Estudos sobre Crenças populares na Inglaterra dos séculos XVI e XVII", ou seja: um extenso e meticulosamente erudito inventário sobre aspectos distintos da mentalidade inglesa no início dos tempos modernos. O resultado desta "aventura" de prospecção não decepciona: a despeito de suas interpretações haverem sido criticadas e revistas na
Na caracterização do imaginário mágico-religioso do Brasil, o Diabo constitui uma das principais, senão a principal personagem. Paradigma na determinação de comportamentos e atitudes mentais, a sua relação com o obsceno está implícita no espaço que ocupa no universo imaginário e nas manifestações que reproduzem e cristalizam sua identificação como o obsceno por excelência, em oposição virtual a uma moral divina. Nossa intenção constitui-se, em primeiro lugar, levantar uma série de proposições e subseqüentemente, sistematizar um quadro das categorias de intervenção da personagem no universo mental que preside a constituição de nossa cultura popular, dentro de uma perspectiva fundamentalmente histórica. Em princípio não estabelecemos uma determinação regional, mas utilizamos toda a documentação disponível, através da tradição oral e da literatura de cordel, que nos permitisse fixar os referenciais e limites da transposição de categorias mentais européias ao nosso contexto de crenças. Este posicionamento nos pareceu o caminho acertado para possibilitar comparações, esclarecer relações ocultas ou no mínimo obscuras, pois malgrado todas as diferenças regionais, a figura e a atuação do Demônio aparecem como uma construção singular específica de adaptação da personagem às relações sócio-econômicas, inscritas no quadro do sistema colonial e em suas determinações posteriores. Para tanto, estabelecemos uma delimitação conceitual, dentro de estrutura mais flexível daquela calcada pelo discurso teológico, que nos levaria, erroneamente, à conceituação apriorística do Demônio como "entidade maligna". Optamos então por conceituá-lo como a oposição fundamental,
Do belo rei ao papa João: 1304-1320: invocações de diabos, pactos satânicos, assassinatos mágicos. Na França, de Paris a Avignon, instalamse processos, armam-se cadafalsos, acendem-se fogueiras. Vinte processos são instruídos envolvendo magia e invocação diabólica contra apenas dois no restante da Europa ocidental. O mais significativo, no entanto, é o fato de que, em dezoito dos casos, estão envolvidas as elites dirigentes em conspirações ou assassinatos com o auxílio de práticas mágicas e intervenção diabólica. Tal concentração, no século XIII, constitui uma singularidade histórica da França dos últimos Capetos, existindo apenas um processo semelhante, contudo acontecido em um momento anterior. Realizado fora da alçada francesa o processo de Walter Langton, iniciado em 1301 na Inglaterra, termina por sua absolvição (1). Acrescente-se que no referido processo os rituais mágicos estão subentendidos, não aparecendo formalmente nas peças acusatórias. Ainda estamos longe dos sabats CARLOS ROBERTO FIGUEIREDO NOGUEIRA magia e política do século seguinte, da existência de uma seita demoníaca, destinada a impedir, ou, no mínimo, pôr obstáculos à conclusão da obra do Redentor: aqui a componente política é visível e dominante. Adversários são eliminados, mortes ou males súbitos são explicados através da ação de encantamentos, maldições e envenenamentos mágicos. Essa verdadeira onda de conspiração mágica parece ter início em 1303, quando Bonifácio VIII é deposto em uma assembléia no Louvre por Felipe, o Belo, acusado por seus oficiais de invocação de demônios, consultas a adivinhos e possuir espírito familiar, dando início a um longo processo que se arrasta post mortem até 1311, quando, sem nenhum alarde, as acusações são abandonadas (2).
Inês de Castro está presente em uma exígua e singular quantidade de textos produzidos no Brasil, pelo menos até a realização do Seminário “Inês de Castro: a época e a memória”, em 2005, na Universidade de São Paulo, um marco na produção acadêmica de cunho historiográfico sobre a personagem e sua época. Até então, a produção escrita relativa a Inês de Castro esteve circunscrita a uns poucos ensaios literários sobre a presença da mulher na literatura renascentista; a uma peça teatral, de autoria de autoria de Gondim da Fonseca, anunciada como projeto de recuperação da “verdade histórica e realidade psíquica” dos amores de Inês e Pedro; e a um livro que tem como singularidade a inclusão do Espírito de Inês de Castro no rol dos autores e que apresenta um conjunto de cartas supostamente ditadas pela personagem, ao longo do ano de 1977, por intermédio do espírita brasileiro Chico Xavier. O presente artigo tem por propósito debater as propostas de abordagem apresentadas em textos de naturezas distintas, tendo como referências os parâmetros ideológicos e as conjunturas particulares nas quais eles foram produzidos.
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