Este artigo analisa os catálogos de três exposições apresentadas no Memorial da Resistência de São Paulo que têm como principal material expressivo fotografias de mortos e desaparecidos políticos, vítimas das ditaduras civil- militares da Argentina, do Brasil e do Chile. “Buena memoria”, de Marcelo Brodsky, “Ausenc’as”, de Gustavo Germano, e “119”, de Cristian Kirby, são examinados pelo modo como mobilizam esses retratos, destacados em suas estratégias próprias. Guardadas as singularidades de cada trabalho, a análise aponta neles uma potência comum: a capacidade de agenciar os olhares encarnados nas imagens, que então podem mirar de volta os espectadores para deles exigir recordação, responsabilização e redenção.
Este artigo observa a construção da potência mnemônica em Faces of Auschwitz, projeto da colorista Marina Amaral que resgata retratos de identificação feitos no campo de extermínio nazista e os põe em cores. O trabalho é apreendido pelo modo como reordena e subverte o propósito das imagens originais, levando-as da tentativa de assujeitamento à capacidade de comemoração e de restituição da memória das vítimas do Holocausto, assentada nos vestígios de humanidade e de dor. O registro da jovem Czesława Kwoka, produzido pelo então prisioneiro Wilhelm Brasse e colorizados por Amaral, além de outros retratos, são tomados como ponto de partida para as discussões aqui propostas.
Este artigo examina o processo de delimitação de um tipo específico de fotodocumentário, aquele politicamente engajado com os problemas sociais da América Latina, como suposta essência da fotografia da região. Investigam-se, em particular, os antecedentes de um projeto de identidade estabelecido nas décadas de 1970 e 1980 e a influência que as atuações do Consejo Mexicano de Fotografía e do seu então presidente Pedro Meyer exerceu na conformação de tal projeto, em especial durante as duas primeiras edições do Coloquio Latinoamericano de Fotografía, nas quais essa identidade para a fotografia local foi defendida. Ao final, arrolam-se duas consequências daí decorrentes: a visibilidade dada a uma rica produção fotográfica que passou a ser divulgada internacionalmente e o ocultamento de trabalhos realizados segundo outras propostas.
<p>O Arquivo Pedro Meyer é uma plataforma digital na qual todo o trabalho fotográfico do artista, além de textos e vídeos sobre ele, está disponível sem qualquer filtro do produtor. O presente artigo<em> </em>se propõe a apresentar esse banco de dados bem como a refletir sobre as implicações que ele traz para a circulação, a difusão e a recepção das imagens de Meyer. Por meio de análises documentais e pesquisas bibliográficas, compreende-se que, ao tornar visíveis seus métodos de produção, o fotógrafo revela uma forma autêntica de lidar como sua criação, entendida não como produto final, mas como algo inacabado e incompleto. Além disso, na medida em que dá ao espectador a chance de entrar nos bastidores de sua obra, olhando-a ‘de dentro’, Meyer permite que ele também passe a entendê-la <span>reintegrada e ressignificada pelos seus processos de fabricação.</span></p>
A fotografia, entendida em seu valor de testemunho histórico e em sua potência poética, pode comportar leituras distintas dos fatos, de como eles foram e de como poderiam ter sido. O presente artigo investiga de que modo essas duas facetas se apresentaram em imagens de Dilma Rousseff feitas na ditadura civil-militar e reapropriadas durante a campanha eleitoral de 2014 e a luta contra o impedimento de 2016. Por meio da análise do processo de transmutação de sentido e de adequação memorialista por qual passaram essas imagens, avalia-se as implicações da mudança de temporalidade que as permeou, posto que, recompostas e ressignificadas, as fotos já não aludiam mais a um passado dado e se configuravam como materializações de uma instância simbólica que apontava para o futuro, para certo horizonte de expectativas. Além disso, tenta-se explicitar como, ao propor comparações entre passado e presente, as imagens inadvertidamente ajudaram a sabotar o amanhã por elas almejado.
Este artigo toma para análise o trabalho In Color: Slavery in Brazil, 1869, da colorista Marina Amaral para observar de que maneira o gesto de apropriação da artista ressignifica os arquivos da escravidão brasileira, mais precisamente os tipos fotográficos feitos por Alberto Henschel. Parte-se do entendimento de que as imagens de Henschel (e de outros fotógrafos da época que apontavam suas câmeras para mulheres e homens negros) são assinaladas por uma lógica tipificadora que perpassa não apenas sua produção, mas seu consumo, no passado e no presente. Nessa acepção, os novos sentidos que são alcançados com o projeto da artista só podem emergir da ruptura com esse estatuto. Para isso, Amaral recorre à colorização e à montagem das fotografias de maneira que convida o espectador a enxergá-las de outro modo, distanciado daquele que é o cerne da representação das pessoas negras escravizadas: a ideia de Outro, peculiar, diferente e estranho. O que a colorista propõe, em direção contrária, é fazê-las aparecer nas fotos a partir de sua natureza humana. Trata-se, defende-se aqui, de uma ação de caráter estético amplo, de teor político – essencialmente antirracista.
Historicamente, a fotografia documental foi concebida a partir da missão de reproduzir o mundo em sua factualidade, em sua existência concreta e material. Entretanto, nos últimos anos, essa percepção tem sido desafiada por imagens fotográficas cada vez mais contaminadas por outras dimensões do real. A virtualidade é uma das mais importantes: de fato, as fotografias são afetadas por virtualidades que funcionam como um campo de forças crucial para o processo de produção das imagens e para o seu resultado final. Identificar e definir diferentes níveis e vetores dessa virtualidade, bem como as consequências que eles exercem para a função testemunhal desempenhada pelo fotodocumentário, torna-se, pois, imprescindível para o melhor entendimento dessas fotografias.
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