Desde 2008 que a crise económico-financeira, social e política e as medidas políticas implementadas para a enfrentar têm provocado alterações significativas no que respeita aos níveis de bem-estar e proteção social de setores significativos da população. Espoletada com a bolha imobiliária nos Estados Unidos da Amé-rica, esta crise tornou-se global, atingindo diretamente vários países da Europa e, reflexamente, em países de outros continentes mais dependentes da exportação de bens de consumo, em virtude da retração da procura e o congelamento do cré-dito quer para o consumo quer para o investimento (Seguino, 2010). Marcadas pela austeridade e pela retração da despesa pública em proteção social e apoio ao crescimento económico, as políticas públicas têm exacerbado as desigualdades sociais, na medida em que tendem a privatizar os riscos sociais e a desregulamentar os mercados de trabalho. A literatura sobre a atual crise e a austeridade é já abundante (p.e., Rubery, 1988;Walby, 2009;Seguino, 2010; Rubery, 2011; Karamessini e Rubery, 2014;Griffin, 2015). São, porém, raras as análises sobre os impactos ao nível dos regimes de sexo/género, entendidos como configurações das relações sociais entre mulheres e homens, determinadas, em cada contexto, pelo enquadramento institucional, pela economia e pelos estilos de vida. Nessas configurações são dimensões-chave a divisão da esfera pública e privada e da produção e reprodução entre mulheres e homens (Walby, 2004). Em cada momento histórico, cada regime de sexo/género oferece oportunidades de vida e impõe exigências a mulheres e homens. No contexto da crise atual, interessa, por isso, perceber qual o papel que nos regimes de bem-estar se reserva ao Estado, ao mercado e à família e qual o modelo de família que é promovido (Daly, 2011; León e Migliavacca, 2013). Importa, portanto, conhecer as oportunidades abertas e exigências impostas a mulheres e homens pelas configurações contextualizadas dos regimes de sexo/género e bem-estar e pelos modos de gestão da crise.Embora as primeiras manifestações da crise tenham atingido primordialmente os setores mais masculinizados do emprego, vários estudos têm vindo a mostrar que o emprego feminino não deixou de ser afetado principalmente como consequência das medidas de austeridade adotadas pelos governos para «com-bater» a crise, entre as quais se destacam os cortes nos apoios sociais, o aumento dos impostos e a redução dos efetivos da administração pública (vejam-se o conjunto de análises incluídos no volume editado por Karamessini e Rubery, 2014). O princípio do universalismo tem vindo a ser abandonado em favor da familização (Daly, 2011). A generalização da condição de prova de meios dos agregados ex aequo, n.º 32, 2015, pp. 11-13