RESENHASChristophe Charle é atualmente professor de história contemporânea na Sorbonne (Paris I), estando também ligado a vários projetos coletivos de pesquisa dentro e fora da França. Desde o início de sua carreira como pesquisador, na década de 1970, ele vem se destacando por seus estudos sobre a composição e as transformações das elites nacionais européias entre fins do século XIX e primórdios do XX. Em alguns desses trabalhos, analisou as trajetórias e a produção específica de professores universitários, jornalistas, artistas e altos funcionários de seu próprio país (CHARLE, 1979;1980;1990;. Em outros, tratou das mesmas categorias profissionais a partir de uma perspectiva mais ampla, comparando ora a política, ora a arte, ora o sistema de ensino de vários Estados europeus (CHARLE, 1996;2001). Independentemente da escala, mas privilegiando sempre a interface entre História e Sociologia, Charle empenhou-se em mostrar os conflitos e as tensões inerentes à complexificação da divisão do trabalho de dominação social na modernidade.Théâtre en capitales: naissance de la société du spectacle leva adiante o mesmo horizonte de temas, embora o faça com uma quantidade de fontes e com um leque comparativo antes jamais mobilizados pelo pesquisador. Isso se explica porque, diferente do que uma leitura apressada do título pode sugerir, o livro não propõe apenas uma história dos teatros de quatro importantes capitais européias, entre os anos 1860 e 1914. O autor realiza, antes, uma história social dessas cidades e de seus habitantes a partir do teatro.Similar inversão de papéis nada tem de ingênua ou de gratuita. Com efeito, enquanto produção artística, também essa modalidade de espetáculo permite a discussão de inúmeros aspectos da vida econômica, política e cultural dos grupos envolvidos direta e indiretamente com ela. Tal recorte temático é ainda mais analiticamente estratégico se levarmos em conta o aumento do número absoluto e a progressiva diversificação de tais grupos no período tratado, sobretudo em função da crescente democratização do acesso ao teatro. Daí o autor propor-se a falar de uma "sociedade do espetáculo" ou, em outras palavras, de uma sociedade cujo epicentro pode ser apenas vislumbrado desse espaço.A centralidade social do teatro explica, a reboque, a escolha das cidades estudadas (Paris, Londres, Viena e Berlim), muito embora outras sejam evocadas en passant (Munique, Nápoles, Nova Iorque, Rio de Janeiro). É aí, sustenta o autor, que o acesso aos espetáculos amplia-se de maneira inédita, deixando traços documentais nada desprezíveis (estatísticas governamentais, registros das próprias salas de teatro, críticas das peças na imprensa). Some-se a isso a consolidação de um circuito internacional também sem precedentes de peças, de artistas e dos públicos das referidas capitais, tendo Paris como maior núcleo exportador. Graças a um tal contexto e partindo da constatação dos sucessos e fracassos de certos temas, Charle permite-se isolar variá-veis capazes de explicar algo dessas acolhidas particulares, dos tab...