Resumo. São analisados resultados de estudos de médio de longo prazo e observações ao longo de anos, demonstrando variações anuais, sazonais e infra-anuais (períodos superiores a um ano), em ecossistemas cavernícolas brasileiros. São abordadas comunidades de morcegos e de invertebrados em diferentes áreas cársticas brasileiras, com ênfase no Alto Ribeira (SE Brasil). Para descrição da diversidade taxonômica das comunidades subterrâneas e compreensão do funcionamento desses ecossistemas singulares, é necessário esforço amostral compatível com seu dinamismo, testado quanto à sua suficiência, sobretudo quando o objetivo é classificar cavernas em graus de relevância. A inadequação da atual política de proteção ao patrimônio espeleológico brasileiro, recentemente flexibilizada pelo Decreto 6640/2008 e correspondente IN MMM 2/2009, é discutida com foco nas suas evidentes falhas conceituais e metodológicas, propondo-se sua total revisão.
Palavras-chave. Ecossistemas subterrâneos, variações anuais e infra-anuais, protocolos de estudos ambientais.Abstract. Results from medium to long term studies and extended observations demonstrate the occurrence of annual (seasonal) and infra-annual variations in Brazilian cave ecosystems. Bats and invertebrate communities from different karst areas are focused, with emphasis on the Alto Ribeira (SE Brazil). For a biologically meaningful description of the subterranean biodiversity and to understand the functioning of these unique ecosystems, sampling efforts compatible with their dynamics are required, especially when the purpose is to classify caves into relevance degrees, making their destruction possible. The inadequacy of the current environmental policy is discussed, based on conceptual and methodological flaws of the recent Decree 6640/2008, regulated by the IN MMA 2/2009. In view of the ineffectiveness of these legal articles, I propose their complete revision.
Keywords. Subterranean ecosystems, annual and infra-annual variations, environmental studies protocols.
Contato do autor: etrajano@usp.br
IntroduçãoA ocorrência de ciclos biológicos sazonais, relacionados a ciclos geofísicos com períodos de cerca de 12 meses, é amplamente conhecida. Muito menos compreendidas são as consequências dos ciclos infra-anuais (períodos superiores a um ano -Marques e Menna-Barreto, 1999) sobre a ritmicidade biológica, desde o nível de ecossistema ao individual. Diferenças entre anos são reconhecidas nos cada vez mais raros estudos em campo do médio ao longo prazo (p. ex., Trajano, 1985;Pellegatti-Franco, 2004;Bessi-Pascoaloto, 2005). Existe uma clara predisposição a atribuir tais diferenças a tendências unidirecionais (não--cíclicas), no sentido de diminuição ou aumento. Porém, a única maneira de distinguir fenômenos biológicos cíclicos de tendências unidirecionais é realizar estudos de longa duração, abrangendo pelo menos três vezes o período que se pretende investigar (Marques e Menna-Barreto, op. cit.) -isto significa que são necessários pelo menos três anos para se detectar padrões sazonais...