Ouvir vozes: um estudo netnográfico de ambientes virtuais para ajuda mútua

Abstract

Resumo: O artigo tem como foco de reflexão a formação de uma rede social constituída através de uma mídia social da internet, a Intervoice, buscando compreender de que forma as redes sociais se integram em ofertas de ajuda mútua. Ao escolhermos como eixo de nossa abordagem a experiência vivida por ouvidores de vozes em ambientes virtuais da Intervoice, buscamos identificar a existência de uma mudança de perspectiva em relação às abordagens tradicionais da psiquiatria no que concerne ao cuidado oferecido, no sentido mais amplo, ao seu público-alvo, bem como analisar se essa mídia social favorece o processo de ajuda mútua para pessoas que ouvem vozes. Desenvolvemos uma metodologia a partir da observação das postagens da Intervoice no Facebook, de setembro de 2014 a maio de 2015. Após análise minuciosa, identificamos que o Facebook foi a mídia mais utilizada se comparada ao Twitter e YouTube. Recortamos os posts e comentários mais interessantes e pontuamos assuntos e discussões específicas, sobretudo as que tratavam de ajuda mútua. Os resultados apontam para a extrema relevância que a ajuda mútua vem ganhando nos últimos tempos, através de ambientes virtuais e redes sociais, sobretudo pela possibilidade de interação em tempo real. Palavras-chave: ouvidores de vozes; ajuda mútua; mídia e redes sociais.

Potential Applications of Digital Technology in Assessment, Treatment, and Self-help for Hallucinations

“…11 The HVN has been an early adopter of the internet as a means of promoting peer support, actively using bulletin boards and email mailing lists among voice-hearers since the early days of the Internet, extending to the formation of Facebook groups, and the intervoiceonline.org and local websites. 105 In addition to using these asynchronous mediums of communication to connect voice-hearers, the HVN has innovated in organizing virtual peer support hearing voices groups using text-based chat or video conferencing for persons unable to attend in-person groups. 106 There has yet to be systematic research on this.…”

Redes e mídias sociais: o potencial multiplicador para a ajuda mútua de ouvidores de vozes

“…Esses espaços são gratuitos e de livre acesso, proporcionando troca de informações e conhecimento. [15][16] Eu tenho muitas coisas para contar para as outras pessoas que podem ajudar e eu gostaria de ouvir das outras pessoas para que eu pudesse ajudar e não me sentir sozinho. Eu tenho muito medo de perder minha cabeça e ficar insano e acabar em uma instituição para o resto da minha vida.…”

“…O grupo Intervoice no Facebook demonstra oferecer apoio e conforto, além de uma visão mais clara aos que sofrem de sintomas tão esmagadores através da partilha de informações. [15][16] No ambiente virtual, encontramos postagens que evidenciam que a natureza das vozes, podem ser positivas, contraditórias ou negativas, e que, dependendo da sua natureza, o indivíduo tem mais facilidade ou não para lidar com elas. Contudo percebemos que a troca de experiências no ambiente virtual se traduz em uma ferramenta muito importante no aprendizado de aceitar as vozes e estabelecer um equilíbrio que o permita a servir-se delas para viver o seu dia-a-dia.…”

“…Contudo percebemos que a troca de experiências no ambiente virtual se traduz em uma ferramenta muito importante no aprendizado de aceitar as vozes e estabelecer um equilíbrio que o permita a servir-se delas para viver o seu dia-a-dia. [15][16] Eu me pergunto a mesma coisa. Algo muito positivo para os membros é o alivio de encontrarem seus pares e perceber a intensa interação entre eles, pois todos querem dividir suas experiências.…”

“…É interessante notar que as questões são colocadas de maneira positiva e incentivadora, o que dá indícios de ajuda mútua, e de possibilidades de descoberta de novas estratégias para o enfrentamento do fenômeno sem que os mesmos fiquem expostos ao estigma da loucura. [15][16] Percebemos que a partir das interações, o grupo cria um espaço onde as pessoas não são objetos de ações assistencialistas, e sim sujeitos que constroem e participam ativamente das decisões das suas vidas. Embora reconheçam que ouvir vozes pode causar sofrimento extremo, considera-se que é uma experiência significativa que pode ser explorada e compreendida, ao invés de ser reduzida a um sintoma patológico desprovido de contexto.…”