Os conflitos vivenciados em torno do trabalho docente na perspectiva de professoras da educação básica em contexto de pandemia

Abstract

O presente trabalho apresenta reflexões acerca dos conflitos vivenciados em torno do trabalho docente na perspectiva de professoras da educação básica em contexto de pandemia. Estamos vivendo um momento novo com a pandemia da Covid-19 que, por sua vez, está articulado às produções linguageiras em torno do trabalho docente. Este contexto demanda do professor novas formas de agir, para criar e (re)criar suas ações profissionais, portanto, falar e refletir sobre os elementos em torno da atividade docente irá proporcionar a construção e (re)construção das significações em relação ao trabalho docente. A partir do momento em que os professores verbalizam sobre os elementos em torno do seu trabalho, eles nos permitem ter acesso a indícios de conflitos que possam estar vivendo neste período de pandemia, que tanto podem ampliar quanto amputar o poder de agir. Assim, analisar os conflitos presentes no trabalho docente, principalmente em contexto de pandemia, período de mudanças abruptas, se faz necessário. Nessa perspectiva, esta pesquisa apresenta a seguinte questão: quais os tipos de conflitos vivenciados pelas professoras da educação básica de uma escola pública no contexto de pandemia e distanciamento social? O objetivo geral é investigar quais os tipos de conflitos vivenciados por três professoras da educação básica de uma escola pública no contexto de pandemia e distanciamento social e os específicos são: propor uma interação/diálogo com as professoras para que elas tenham a oportunidade de dizer sobre seus sentimentos e significações relacionados ao trabalho docente; discutir, com três professoras da rede municipal, as experiências em torno da atividade docente neste período de pandemia; e analisar os textos que foram produzidos por meio das entrevistas para que possamos mapear os tipos de conflitos vivenciados por elas neste momento de pandemia e distanciamento social. A pesquisa fundamenta-se no quadro teórico-metodológico do Interacionismo Sociodiscursivo (ISD) (BRONCKART, 1999, 2006a, 2008; MACHADO, 2007, 2009a, 2009b), o qual busca demonstrar que as práticas linguageiras são grandes instrumentos e a linguagem um elemento sine qua non para a teoria. Estabelece-se também um diálogo com a Clínica da Atividade (CLOT, 2006a) e com a Ergonomia da Atividade (AMIGUES, 2004), que se voltam para a questão do trabalho em geral e também ao trabalho docente. Para alcançar os objetivos propostos, a pesquisa perpassará por uma revisão da literatura, elemento central de qualquer pesquisa, e, para geração dos dados, pela entrevista. Para analisar os diálogos produzidos nas entrevistas, serão utilizados os Seguimentos de Orientação Temática (SOT) e os Segmentos de Tratamento Temático (STT) (BULEA, 2010). Os resultados revelam diferentes tipos de conflitos, cujos principais elementos circundam a atividade docente, principalmente no contexto de pandemia, em que as professoras tiveram que fazer a transição do modo de agir vivido por elas até então, por um agir docente nunca antes vivenciado.

Um estado da arte possível: contribuições da pesquisa em educação sobre pandemia no Brasil

“…Algumas redes particulares logo se organizaram e adaptaram à nova realidade, pois já eram incentivadas a utilizar plataformas educacionais ainda antes da pandemia; dessa forma, mesmo que tenham enfrentado dificuldades na articulação do currículo no novo formato, a assimilação e o acesso às tecnologias foram facilitados, podendo, inclusive, conforme explicitado por Wolff (2020), já esboçar novas perspectivas para o uso das tecnologias no retorno às aulas presenciais. O mesmo não ocorreu em muitas escolas públicas que tiveram cortes orçamentários, e algumas nem sequer acesso à internet possuíam (ÁVILA, 2021;COSTA, 2021).…”

“…Os desafios descritos por Ávila (2021) são recorrentes também em outros estudos que tratam da educação pública. Costa (2021) evidenciou a solidão docente no trabalho pandêmico, a falta de autonomia pedagógica e, ainda, as dificuldades de acesso e utilização das tecnologias digitais, tanto por docentes quanto por discentes. Mendes (2021) discutiu como o afastamento da escola aproximou os(as) jovens do subemprego e fez com que perdessem seus espaços de constituição de redes de apoio para a passagem pela adolescência.…”

“…O estereótipo criado de que só o(a) docente da rede particular estava trabalhando tem relação com a ideia de que muitos desses(as) professores(as) estavam em transmissão ao vivo e diária com os(as) estudantes, ao passo em que grande parte dos(as) docentes das escolas públicas, muito por conta do contexto de desigualdade, não faziam esse tipo de aula diariamente. Contudo, estes últimos estavam envolvidos na criação e na correção de atividades, busca de estratégias para chegar aos(às) estudantes, gravação de vídeos, troca de mensagens por aplicativo de celular, entre outras estratégias utilizadas pelas redes (ÁVILA, 2021;COSTA, 2021;SANTOS;FERRETE;ALVES, 2021;THIENGO et al, 2021).…”

Trabalho Pedagógico Remoto: Questões Emergentes E Questões De Sempre

“…Foram renovados os mecanismos de controle e vigilância ao trabalho docente. Um desses mecanismos foi a intensificação da cobrança, por parte da gestão escolar, de prestação de contas por meio de relatórios que documentavam as aulas remotas (BARBOSA, 2022;COSTA, 2021;MO-RENO, 2022;SOARES, 2020;ZIENTARSKIL;SOUSA;MARTINS, 2021).…”

“…A grande quantidade de novas atividades que se somavam àquelas já realizadas pelos docentes e o monitoramento das atividades realizadas nas aulas remotas concorreram para a extensão da jornada de trabalho e intensificaram a vigilância ao trabalho docente (BARBOSA, 2022;COSTA, 2021;SOARES, 2020;PORTELINHA et al, 2021;ZIENTARSKIL;SOUSA;MARTINS, 2021).…”