2 e estará presente em suas peças produzidas a partir de 1994, através do cenário e do sotaque indicado nas rubricas. O espaço e o dialeto, portanto, são a marca de Irishness que a dramaturga imprime à sua obra. Entretanto, nesse espaço realista, são introduzidas figuras sobrenaturais, ultrapassando, pois, a representação mimética da realidade; por outro lado, não faltam alusões a lendas e mitos, o que contribui para expandir o alcance de suas peças para áreas universais da experiência humana. Na década de 1980, Marina Carr mudou-se para Dublin e, após graduar-se em 1987, em Inglês e Filosofia, pela University College (UCD), morou por um ano em Nova Iorque, dando aulas e escrevendo. É possível, como especula Sarahjane Scaife, atriz irlandesa que vivia nessa mesma cidade na época, que a vida fervilhante de Nova Iorque, com seus espetáculos de rua, com o teatro experimental que então lá se praticava, mesclando teatro de bonecos, ópera e musicais, possa ter tido influência sobre a futura dramaturga, em cujo trabalho se verifica a mesma sensação de vertigem que se experimentava naquela cidade americana, o êxtase incrível e as quedas bruscas, como que provocadas pela ingestão de uma droga: "Este sentido dos dois lados da moeda-negro desespero e humor cortante e agudo-está presente o tempo todo no trabalho de Marina" (SCAIFE, 2003, p. 8-9) 3. A atriz está certa; por mais sufocante que seja o enredo da peça, como acontece, por exemplo, em On Raftery's Hill, de 2000, sempre há lugar para o humor, aqui trazido por Shalome, a mãe do protagonista, uma personagem esclerosada, com raros momentos de lucidez. Após retornar a Dublin, Marina Carr chegou a iniciar seus estudos de pós-graduação sobre Samuel Beckett, no Trinity College, um projeto abandonado, mas não esquecido, uma 2 "[I think it's no accident it's called the Midlands. For me at least it has become] a metaphor for the crossroads between the worlds." 3 "This sense of the two sided coin of black despair and sharp cutting humour is present all the time in Marina's work." vez que ela expressou recentemente seu desejo de retomar os estudos acadêmicos. Suas primeiras peças revelam a influência do famoso dramaturgo, ela própria confessando que tentava mesmo ser beckettiana. 4 A esta primeira fase de sua produção teatral (1989-1991), seguir-se-á um segundo momento que revelará outras paixões da dramaturga, como William Shakespeare e os clássicos gregos. Esta segunda fase-chamada de Midlands-, que tem início com The Mai (1994), estaria se encerrando em 2002, tendo em vista a declaração de Marina Carr, em entrevista a Melissa Sihra, na ocasião em que estava terminando de escrever Ariel: "É minha despedida a Midlands [...]" (CARR, apud SIHRA, 2001, p. 55). 5 Nos anos de 1995 e 1996, Carr tornou-se escritora residente do Abbey Theatre, o teatro nacional da Irlanda, passando, em 1999, a desenvolver o mesmo trabalho no Trinity College. Ainda em 1996, foi recebida como membro da Aosdána, instituição que reúne artistas proeminentes das áreas de literatura, música e artes visuais. E...