O corpo e as coisas: a dissolução da fronteira entre o vivo e o não-vivo no contexto do teatro contemporâneo

Abstract

(2001), a expressão dramática ou teatral, de acordo com acepção clássica do termo, é concebida como uma exteriorização, uma manifestação de aspectos encobertos ou de um sentido profundo, assim sendo, como um elemento do interior para o exterior. De acordo com Pavis, em última instância, este papel revelador é atribuído ao trabalho do ator, a medida que cabe a ele o papel de interpretar o poeta por meio de sua atuação, revelando-nos suas intenções mais secretas, numa espécie de ex-pressão que promove a exposição da significação e que se realiza melhor em cena -sempre de acordo com o dogma clássico -por meio da expressividade gestual e corporal. Ainda conforme Pavis, na teoria clássica da expressão o sentido sempre existe previamente ao texto, sendo a expressão apenas uma espécie de "extração" que expõe uma idéia anterior. De acordo com essa concepção, é a experiência estética do autor que é fundamental, num processo que encerra uma supervalorização da idéia às custas da matéria expressiva da cena, uma crença no sentido anterior à expressão (Pavis, 2001, p154).No tocante à arte teatral, reflexos desta concepção podem ser encontrados, por exemplo, num texto de Sartre, "O Imaginário" (1940), no qual o filósofo, dirigindo seu foco de atenção ao teatro, reconhece na figura do ator (seu corpo, sua respiração, etc) o correspondente ao representante analógico -analogonda personagem. De acordo com Sartre, "o intér-prete de Hamlet, por exemplo, serve-se de si mesmo, de seu corpo, como analogon desse personagem imaginário.[...] Ele utiliza todos os seus sentimentos, suas forças, gestos como analogon dos sentimentos e dos comportamentos de Hamlet. Mas, precisamente por esse motivo, irá irrealizá-los. Ele vive inteiramente num mundo irreal (Sartre,1996). Não obstante o fato de atribuir grande valor ao gesto no trabalho do ator, tal valoração está sempre associada ao que a gestualidade encerra em termos de sua significação dentro de um contexto objectual, vinculado a uma ação. Dessa maneira, o gesto nunca é percebido por si, mas sim como meio, anteparo "transparente" através do qual projeta-se uma imagem.Em última instância, porém, essa concepção que reconhece os elementos expressivos da cena apenas enquanto meios de manifestação de aspectos ligados ao contexto objetual nos reme-

O corpo esgotado: um estudo crítico sobre práticas de ensino corporal na formação do ator

“…Por exemplo, na análise feita por nós em 68 artigos da Revista Sala Preta, a partir de temas que perpassavam a formação corporal de atores, encontramos um leque amplo de termos para se referir ao corpo do ator. Apresentamos alguns: corpo cênico, corpo disponível, corpo plástico, corpo articulado, corpo potente para a expressão, corpo como ser íntegro, corpo expressivo, corpo ideal, corpo revelado, corpo vocal, o corpo como sujeito ele próprio (SETTI, 2007); corpo vivo, dimensão simbólica do corpo, dimensão física do corpo (SOUZA, 2007); corpo fascista, corpo excitável, corpo auto-modulável, corpo espetáculo, corpo blindado (PELBART, 2007); corpo intenso, corpo próprio, corpo pleno (FUGANTI, 2007); corpo que pensa (CHAVES 2005); corpo-orquestra (GOMES, 2005); corpo-objeto (COSTA, 2011, v. 1); espaço corpopróprio (MACHADO, 2011, v. 1); corpo instrumental (VELARDI, 2011, v. 1); corpo dançante (VILELA, 2011, v. 1); corpo comum (BENVEGNU, 2011, v. 1); corpo fenomenológico, corpo cotidiano, corpo semiótico, hábil, corpo capaz de produzir signos a serem decodificados, corpo expressivo, corpo material, corpo como uma ferramenta, como um meio de expressão ou como um material criador de signos, corpo específico (BELÉM, 2011, v. 1); "corpo do bailarino-ator é um corpo que esboça e incorpora memórias" (WEBER, 2011, v. 1, p. 167); corpo banido, corpo enclausurado, corpo apartado da sociedade, corpo como capital simbólico, corpo híbrido na dança contemporânea, corpos aparelhados, corpos desapararelhados, corpos hiperaparelhados, corpo é matriz de significado, corpo mídia, corpo relacional, corpo permutador de códigos -corpo que não fala, mas que faz falar sobre a cultura -, corpo natural, corpo dançante, corpo do artista como suporte da arte, "corpo é matéria prima e elemento do processo artístico (...) através do corpo se pode ocupar uma posição social de prestígio e de reconhecimento" (COCCARO, 2011, v.1, p.173); corpos diferentes, corpos da performance (AGRA, 2010); corpo visto enquanto laboratório de intenções e interrogações artísticas, corpo teatral -que é preciso reabilitar - (CHAVES, 2009); corpo pensante, corpo-depoente, corpos-depoentes, corpo como sujeito (LEONARDELLI, 2009); corporeidade autossuficiente, presença corporal pós-dramática, corpo vivo (BELLONI, 2008); corpo pré e corpo pós experiência, corpo-mundo, corpo espinosiano, potência-corpo, dramaturgia do corpo, resposta-corpo, consciência corporal, criação de corpos, corpo não treinado para o palco (FABIÃO, 2008); corpo banhado em autoestima, corpo que traz mais matéria expressiva, corpo teatralmente falante e presente, "o corpo é a superfície ...…”