Maternidade, culpa e ruminação em tempos digitais

Abstract

RESUMODesde o século XVIII, o sentimento de culpa esteve tão atrelado à maternidade quanto os ideais de dedicação e amor. Recentemente, discussões sobre ela têm aumentado, sobretudo nos sites de redes sociais. São debates que buscam, entre outros objetivos, repensar valores tradicionalmente associados à atividade materna. O artigo explora as modificações históricas e subjetivas que permitiram que mulheres falassem sobre uma questão íntima (a maternidade) em um ambiente compartilhado. Para isso, analisa alguns comentários feitos por mães no site de rede social Facebook sobre suas vivências maternas, tomando por base os conceitos de ruminação de Nietzsche (século XIX) e de culpa de Freud (século XX). Ao acionar dois dos mais influentes pensadores modernos para refletir sobre manifestações contemporâneas, percebese que os discursos produzidos pelas mães procuram se afastar do sentimento de culpa materna, em um processo que se aproxima do que Nietzsche classifica como ruminação das experiências. Palavras ABSTRACTSince the eighteenth century, the feeling of guilt has been as tied to motherhood as the ideals of dedication and love. Recently, discussions concerning motherhood have increased, including on social network sites. These debates seek, among other goals, to rethink values traditionally associated with maternal activity. The article explores the historical and subjective changes that allowed women to talk about an intimate issue (motherhood) in a shared environment. To reach such goal, the paper analyzes some comments made by mothers on the social network site Facebook reporting their maternal experiences, based on the concepts of Nietzsche's rumination (19th century) and Freud's guilt (20th century). By triggering two of the most influential modern thinkers to reflect on contemporary manifestations, it is perceived that the speeches produced by the mothers stray from the feeling of maternal guilt in a process that approaches what Nietzsche classifies as a rumination of experiences.

Cativeiro Da Maternidade, Dispositivo E Pedagogia Da Mulher-Mãe: Reflexões Iniciais

“…A influência do filósofo acarretou diversas publicações cujo foco era defender a boa maternidade, compreendida como aquela que responsabiliza integralmente a mulher-mãe pela criação e pelos cuidados com a criança. Em outras palavras, a boa maternidade concebe a normativa de que a maternagem é exercício exclusivo da mulher-mãe (Badinter, 2011;Souza, 2018). Tal movimento visava atender aos interesses políticos e econômicos do Estado em reduzir as taxas de mortalidade infantil para aumentar o número de cidadãos na vida adulta, gerando mão-de-obra para enriquecer o país.…”

O Papel da Coparentalidade e da Rede de Apoio Materna no Uso de Mídias Digitais por Bebês

“…Nesse sentido, a culpa, sentimento que permeia a maternidade em diversos âmbitos (Souza, 2018), se potencializa com a ambiguidade de sentimentos e a falta de informações em relação ao uso de mídias (Mallmann & Frizzo, 2019). As mães que não ofertam mídias digitais aos seus bebês, entretanto, se mostraram solidárias às mães que oferecem, uma vez que entendem esses sentimentos e também sofrem com a pressão social incursa na maternidade.…”

Tensionamentos maternos na contemporaneidade: articulações com o cenário brasileiro*

“…Apesar de esses aspectos ainda serem relevantes em muitas narrativas pessoais brasileiras sobre a maternidade, prevalecem os sentimentos de insuficiência e de frustração, que em muito se relacionam à lógica do estímulo e do desejo. A culpa é inclusive percebida como equivocada por muitas mães nas mídias sociais, algo que precisam superar (Souza, 2018).…”