Obras de ficção podem, dependendo de como estiverem estruturadas por seus autores, ser usadas como textos de referência em sociologia. O caso específico das antiutopias futurísticas é o de que se ocupa esta tese. Os autores desses textos de ficção procuram, como acontece com textos teóricos acadêmicos, fundamentar suas extrapolações em observações cuidadosas de tendências em ação na sociedade e desenvolver sua narração com rigor e consistência. Ou seja, parte da literatura futurística seria um instrumento importante de análise sociológica. Não, frise-se, para análise sociológica, mas de análise sociológica. Noutras palavras, o que se pretende estudar é menos "sociologia da literatura" e mais "literatura como sociologia". A tese, portanto, delimita, em primeiro lugar, o que se deve considerar uma antiutopia (ou distopia) futurística tecnológica e porquê, entre vários tipos de textos futurísticos, são elas as que melhor se prestam a análise como textos sociológicos que discutem, principalmente, o impacto social da ciência e da tecnologia. Depois, expõe-se como surgiu esse gênero literário, hoje assimilado à ficção científica (FC), malgrado as intenções de seus autores. Em seguida, tendo nas 'mãos uma definição do campo e uma apreciação de sua génese na história, são estudados alguns textos representativos. Tendo analisado oito novelas, a parte final da tese expõe uma síntese de como essas obras literárias vêem o impacto social da ciência e da tecnologia e o destino da sociedade e dos indivíduos que a compõe.Nessa síntese, deverá aparecer mais claramente o paralelismo de conteúdo e tendências entre essas obras de ficção e a literatura acadêmica sobre sociologia e filosofia da ciência, o que nos leva a concluir que, feita uma escolha criteriosa, o estudante de humanidades poderá encontrar na estante de literatura valiosos modelos para reflexão sociológica.vir" ("Things to come"). E mais. Não é que tenha havido um desequilíbrio com a Segunda Guerra, ou seja, antes dela existiam mais histórias de futuros bons e, depois dela, mais de futuros ruins. O futuro é ruim desde fins do século passado, desde Wells. É verdade que algumas histórias futurísticas se "beneficiaram" da bomba atómica. Segundo os números de Brians (Brians, 1987), de 1895 a 1944, 38 histórias de FC retrataram as consequências do uso , descuidado da energia nuclear. Mas, nos cinco anos seguintes a Hiroxima e Nagasáqui, de 1945 a 1949, foram 102. Quanto às antiutopias (ou distopias), o número não se altera. Das estudadas nesta tese, quase a metade foi escrita antes da Segunda Guerra. E mais, o advento desta (e das bombas) não alterou o conteúdo desse subgênero da FC. Existem novidades, mas elas não parecem ter relação direta com eventos ligados à Segunda Guerra. Já I. F. Clarke (1986) vê a Primeira Guerra como divisor de águas para a literatura futurística. Antes dela, valia o otimismo quanto aos ilimitados benefícios que a ciência traria para a humanidade já que, segundo o pensamento da época, nada poderia deter o progresso científico e, com ele, o da hum...