A partir da segunda metade do século passado, em Minas Gerais, ocorreu intenso processo de dilapidação da arte sacra colonial presente nas igrejas do estado, por meio de furtos e vendas, alimentando um vultoso mercado de antiquariado, em especial dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Esse mercado, por sua vez, veio a abastecer as coleções de indivíduos das elites econômicas dessas áreas. Passadas décadas, começaram a despontar paulatinamente ações de restituição desse patrimônio sacro disperso, a princípio, voluntariosas e pontuais, mas posteriormente robustecidas pela burocracia estatal, com grande destaque para a atuação do Ministério Público de Minas Gerais. Além de situar em perspectiva esse processo histórico, este trabalho propõe-se a analisar em maior profundidade, e de maneira comparada, dois casos específicos, de modo a compreender as disputas e tensionamentos existentes neles. Os casos escolhidos são o da imagem de Nossa Senhora das Mercês, originária da Igreja das Mercês e Misericórdia de Ouro Preto, e o do busto-relicário de São Boaventura, originário da Igreja de São Francisco de Assis, da mesma cidade. Como resultado, foi possível compreender em maior detalhe o contexto em que se deu a dilapidação do patrimônio sacro mineiro, e também identificar as principais contradições, tensionamentos e desafios presentes no processo de restituição.