Dissoluções Necessárias: A Perspectiva Dos Hupd’äh Nas Relações Do “Sistema Regional Do Alto Rio Negro”

Abstract

Procurando ancorar-se na perspectiva dos Hupd’äh do campo relacional interétnico do Alto Rio Negro-Uaupés, o presente analisa o chamado “viés tukano”, ângulo que privilegia a socialidade de dados coletivos sociais da região em detrimento de outros, e seu impacto para o modo como os Hupd’äh e os povos da família linguística Naduhup figuram no “sistema regional rionegrino”. Para tanto, estabelece-se o paralelo entre, de um lado, narrativas míticas e princípios do pensamento hup e, de outro, o discurso científico etnológico que sedimenta o “grande divisor” composto pelos “índios do rio” e “índios do mato”. Em que medida o ponto de vista Hup sobre o “sistema regional” revela pontos cegos do modelo sociológico e aponta novos caminhos para a reflexão acadêmica sobre as dinâmicas sociais regionais?

Formação e transformação de coletivos entre os Waikhana do rio Papuri (alto rio Negro)

“…8 Para uma história e uma etnografia do povoado de Iauaretê, verAndrello (2006). 9 Um ótimo trabalho sobre essa temática complexa da mobilidade e da atração que o povoado de Iauaretê e, depois, a cidade de São Gabriel passaram a exercer nas últimas décadas, neste caso entre os Hup'däh, é a tese de doutorado deMarques (2015).…”

“…Hugh-Jones, 1995;Lasmar, 2005;Andrello, 2006Andrello, , 2016A. Cabalzar, 2009;Maia & Andrello, 2019;Lolli, 2010;Marques, 2015; dentre outros).…”

Temporalidades e interações socioambientais no noroeste amazônico: apresentação ao dossiê

“…Por vezes, a questão é formulada em termos da assimilação dos aspectos mais emblemáticos da socialidade regional a este ou aquele conjunto linguístico. Já houve comentários críticos acerca de um certo viés tukano que marcou a etnografia da região em sua fase inicial (anos 1960 e 1970), algo que de modo algum faria jus à sua composição demográfica e territorial, majoritamente arawak (ver Reid, 1979;Marques & Ramos, 2019). A partir de então, com os trabalhos de Wright (1981), Hill (1993) e Journet (1995), na década de 1980, os processos históricos e políticos que resultaram na formação desse extenso sistema social regional passaram a ser objeto de hipóteses que defendem uma precedência dos grupos arawak na região, para os quais é atribuída a origem de seus aspectos mais marcantes, entre eles um sistema regional constituído por unidades exogâmicas e patrilineares, uma rede de trocas de longa distância, um esquema de hierarquias sociais referenciado aos mitos de origem e uma atribuição generalizada de significados cosmológicos às paisagens.…”

Cuidando e tomando cuidado: avizinhando-se de situações de \"suicídio\" em comunidades Hupd\'äh

“…Como vimos na introdução, estas já foram definidas como simbióticas, hierárquicas, de escravidão etc. Estudos historiográficos e antropológicos indicam que a atual configuração de tais relações assimétricas altorrionegrinas (e seus respectivos efeitos nas vidas de cada povo e clã) é indissociável da atuação de missionários, Estado, mercadores e demais colonos na região (MARQUES; RAMOS, 2019;LOLLI, 2016;MARQUES, 2015;POZZOBON, 2011;ATHIAS, 2008;ANDRELLO, 2006;WRIGHT, 2005). Dessa forma, compreender as relações assimétricas entre os hupd'äh e outras etnias da região como uma forma de bullying é extremamente impreciso em termos etnográficos e reproduz uma violenta invisibilização dos processos coloniais.…”

“…Parece-me que uma atuação intercultural que não se resuma a um multiculturalismo tolerante implica em conferir dignidade ontoepistemológica a mundos, práticas e teorias "não modernas" (FERREIRA DA SILVA, 2007;LATOUR 1994). Ou seja, implica reconhecer que 226 Comunicação pessoal feita pelo antropólogo Bruno Marques (2019).…”