Crianças em acolhimento residencial: Conteúdo temático das suas narrativas de vida

Abstract

A narrativa constitui uma unidade semântica em forma de história que permite ao ser humano dar sentido à sua experiência. A investigação na área não tem sido conclusiva quanto à capacidade das crianças que vivenciaram maus-tratos integrarem estas experiências nas suas narrativas de vida. Alguns investigadores defendem que os maus-tratos afetam a capacidade mnésica das crianças, dificultando a recordação e a referência destas experiências; outros defendem que experiências traumáticas podem até ser melhor recordadas e hipernarradas do que experiências do quotidiano. Neste estudo pretendeu-se mapear as temáticas que emergem nas narrativas de vida de crianças com passado de adversidade precoce, explorando se o tema dos maus-tratos chega a surgir nestas narrativas ou se até se torna o tema dominante. Participaram no estudo 16 crianças em acolhimento residencial, com idades compreendidas entre os 7 e os 12 anos. Foi utilizada a Entrevista de Narrativa de Vida com Crianças, para a recolha das histórias de vida. A análise temática das narrativas de vida permitiu identificar que as crianças incluem em média 15 temas nas suas narrativas de vida, sendo que metade das crianças relatou episódios de Maus-tratos físicos e/ou psicológicos. A diversidade temática encontrada nas narrativas de vida das crianças aponta para a capacidade adaptativa de estar disponível para a multiplicidade de vivências, sem permanecer dominado por uma narrativa rígida e monotemática. Além disso, a capacidade com que muitas crianças relatam acontecimentos de maltrato, distancia a hipótese da amnésia ou incapacidade de os narrar e encoraja a existência de espaços conversacionais abertos e sem restrições temáticas.Palavras-chave: Narrativas autobiográficas, Narrativas de vida, Crianças, Acolhimento residencial, Conteúdo temático. A narrativa enquanto conhecimentoO ser humano apresenta uma predisposição inata para organizar a sua experiência em forma de narrativa, permitindo-lhe compreendê-la e utilizá-la. Esta predisposição é potenciada pela cultura, através das tradições de contar e interpretar o que partilhamos com os outros, enriquecendo-nos com novas formas de contar histórias (Bruner, 2002).A narrativa surge, não como o espelho exato da experiência, mas como o produto de uma construção de significados, culturalmente enquadrada, por parte do narrador (Gonçalves, 2000). Dado que a narrativa se trata da representação da história de vida, não pode ser verdadeira ou falsa, passando-se de um processo de busca da verdade a um processo de construção de significados. O significado emerge, então, como base para todas as narrativas, na medida em que entendemos o que aconteceu e projetamos o futuro (Gonçalves, 1994). O processo através do qual se constrói a narrativa implica um padrão específico de coerência temporal permitindo dar sentido a uma experiência, que de outro modo seria aleatória e caótica (Gonçalves, Korman, & Angus, 2000). 1A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para:

Attachment, Emotional Regulation and Perception of the Institutional Environment in Adolescents in Residential Care Context

“…These results stress that adaptation to the institutional environment is largely related to the personal characteristics of each child and/or adolescent (Baker et al, 2005;Brady & Caraway, 2002;Magalhães & Calheiros, 2014;Patrício et al, 2016), being particularly important to consider these dimensions for understanding adaption processes and challenges. Previous studies have found sex differences considering attachment and adaptation to institutional environments (Baker et al, 2005, D´Aroz & Stoltz, 2012, Mikulincer & Shaver, 2007Teixeira et al, 2018), nevertheless, considering the scarcity of results, additional knowledge should be produced on the processes underlying psychosocial adaptation and sex in youth in RCC. In what concerns age, although Baker et al (2005) found that children/younger adolescents (<12 years) could exhibit higher conflict behaviors during the transition to a residential setting, considering age range and the transition challenges, these results could address distinctive processes.…”

“…Nonetheless, there seems to be significant variability in the quality of protection and care provided in RCC, with important implications for the development of children and adolescents (e.g., Costa et al, 2019). Therefore, residential care can be a measure of promotion and protection, by promoting not only well-being, but also more adaptive relational and behavioral patterns in adolescents (Teixeira et al, 2018). Moreover, residential care can provide a space of protection, enabling the development of safe relationships (Mota & Matos, 2015;Siqueira & Dell´Aglio, 2006.…”

“…Moreover, residential care can provide a space of protection, enabling the development of safe relationships (Mota & Matos, 2015;Siqueira & Dell´Aglio, 2006. Nonetheless, adolescents face distinctive challenges associated when entering to RCC, particularly dealing with separation from family/relatives and development of new relationships with adults and peer groups (Costa et al, 2019;Piotrkowski & Baker, 2004;Teixeira et al, 2018). The process of entering to an institution is accompanied by the experience of feelings such as fear, insecurity, missing one's family and friends, and the anguish of waiting for a solution, which may condition one's emotional development (Feijó & Oliveira, 2016;Mota & Matos, 2014).…”

Experiências traumáticas na doença crónica: Relatos de adolescentes com escoliose e diabetes

“…Esta abordagem, qualitativa e em profundidade, evidenciou uma grande variabilidade inter-individual, habitualmente esbatida nas abordagens quantitativas. Os resultados podem ser interpretados como uma grande diversidade de respostas às situações de adversidade que reforçam o não determinismo das experiências traumáticas e contribuem para a construção de narrativas adaptativas, já encontrada em estudos com outro tipo de populações com potenciais experiências traumáticas na área do acolhimento residencial (Teixeira, Silva, & Henriques, 2018).…”

Driving for Success in Family Reunification—Professionals’ Views on Intervention

“…Although children’s removal from their families is justified by the urgency of their protection and security, this event and their entry into institutional care have a detrimental impact on their well-being and psychological adjustment. Following their removal, most children display externalization and internalization behaviors [ 3 , 4 ] and insecurity and greater disorganization in their attachment relations [ 5 , 6 , 7 ], and this has a highly negative impact on their life [ 8 ]. Following removal from the family and during their placement in foster care, children have to cope with the emotional impact triggered by multiple losses as well as with the need to adapt to new contexts [ 9 ].…”