Aprendizagem Baseada Em Prática: Entre Remédios E Receitas Em Pequena Farmácia

Abstract

Este artigo versa sobre a temática da aprendizagem organizacional (AO), visando melhor compreensão sob a perspectiva sociológica. Apresenta-se como objetivo: compreender o processo de aprendizagem (individual, grupal, organizacional e interorganizacional) dos trabalhadores de uma farmácia, sob a perspectiva da AO baseada em prática (perspectiva sociológica). Para tanto, realizou-se uma pesquisa exploratória do tipo estudo de caso e com abordagem qualitativa dos dados em uma farmácia de pequeno porte, localizada no norte do Rio Grande do Sul. O estudo permitiu identificar que nessa farmácia, a aprendizagem acontece nos quatro níveis do continuum da aprendizagem, no fluxo das atividades relacionais cotidianas, de acordo com os preceitos dos estudos da AO, baseada na perspectiva prática. As conclusões revelam que o estudo de caso traz contribuições importantes em razão de exemplificar claramente o processo da AO e também da aprendizagem interorganizacional (AIO), na perspectiva baseada em prática.

Aprender a reciclar: um olhar sobre as práticas de trabalho

“…Visto dessa forma, o cotidiano do trabalho compreende um espaço de produção e reprodução contínuas de conhecimento, pois as interações emergem no nível coletivo da aprendizagem, engendradas por relações sociomateriais que ocorrem na prática (Gherardi, 2009(Gherardi, , 2011. Os estudiosos que se dedicam ao campo dos EBPs assumem, portanto, o pressuposto que o saber-fazer emerge de uma produção contínua que se modifica por meio das ações dos indivíduos (Feldman & Orlikowski, 2011;Oliveira et al, 2016;Bussular & Antonello, 2018).…”

“…Elas são construídas e vão se transformando, criando sentido para seus praticantes a partir de seu modo de fazer. Destaca-se que fazeres e dizeres, na prática do trabalho coletivo, incitam modificações durante o desenvolvimento das atividades de modo que, como observam Bussular e Antonello (2018), Feldman e Orlikowski (2011), Gherardi (2011Gherardi ( , 2018, Nicolini (2009a) e Oliveira et al (2016), a cada vez que a prática é (re)produzida, ela sofre variações decorrentes de interações, percepções e significados criados pelos praticantes.…”

“…Na separação/triagem, a utilização de um bag e um saco de lixo como artefatos (Nicolini, 2009a;Strati, 2007) auxilia os recicladores durante a prática de separar o material para poder depositá-los no local correspondente e manter a organização do ambiente, tal como explica Márcia (recicladora): "Quando chega doação pega um bag, né, cada um faz a sua separação, e depois amarra os lixo e varre onde que sujou pra sempre deixa lá embaixo limpo para os enfardadores". Entende-se que há um saber-fazer presente no desenvolvimento do trabalho, o qual trata-se de uma produção contínua que cria forma e altera-se com base na percepção dos praticantes (Bussular & Antonello, 2018;Feldman & Orlikowski, 2011;Oliveira et al, 2016). Sendo assim, a ordem a ser seguida pela prática indica que a manutenção do espaço limpo faz sentido para os recicladores (Gherardi, 2012b;Nicolini, 2009a).…”

“…Neste meio, os fazeres e os dizeres, bem como a ordem das atividades, dissolvem-se no coletivo, pois como seres sociais, eles agem conforme pressupostos comuns, para que seus feitos corroborem os de outros (Gherardi, 2012b;Nicolini, 2009a). Percebe-se igualmente a rede informal que permeia o trabalho dos recicladores, a qual fomenta a aprendizagem coletiva pelas interações (Oliveira, Mozzato, & Colet, 2016), construindo um espaço de informalidade em que o fazer passa a conter sentidos afetivos, pois aquilo que se faz congrega o grupo e leva a entender o espaço como algo desenvolvido por práticas coletivas (Santos & Cassandre, 2017).…”

“…Consubstancia-se o achado com o exposto por Feldman e Orlikowski (2011), Oliveira et al (2016) e Bussular e Antonello (2018), pois se percebe que o fazer emerge da produção que se modifica com base nas ações dos praticantes, isto é, há o aprimoramento da prática que se dá em ação, cada vez que é reproduzida, evidenciando seu caráter contínuo. A inovação em realizar a atividade na prensa elucida o processo de knowing in practice, por meio do aprimoramento de cada prática desenvolvida pelo suporte de um artefato (Gherardi, 2011;Nicolini et al, 2003) e norteada pelo ordenamento legitimado que a prática precisa apresentar para atingir seu propósito e fazer sentido (Nicolini, 2009a).…”