Antônio Vieira, profeta e missionário: um estudo sobre a pseudomorfose e a contradição

Abstract

O ensaio busca analisar dois aspectos ideológicos e semânticos da obra de Antônio Vieira: a pseudomorfose (tema da primeira parte) e a contradição. A pseudomorfose ou falsa forma é uma figura pela qual a camada superficial do texto não corresponderia à sua mensagem profunda: baseado em profecias bíblicas e nas trovas de Bandarra, Vieira cria a imagem de um Quinto Império universal e cristão sob a qual, porém, se pode detectar o projeto de um vasto império português. Quanto à contradição (tema da segunda parte), a obra missionária de Vieira revela agudo contraste entre a luta pela liberdade dos índios do Maranhão e a aceitação do trabalho escravo dos negros africanos. Verifica-se também contradição entre essa atitude conformista e a veemente defesa da igualdade de todos os homens criados pelo mesmo Deus e redimidos pelo mesmo Salvador.<br>This essay aims at analysing two ideological and semantic aspects of Antônio Vieira's works: the pseudomorphosis (theme of the first part) and the contradiction. The pseudomorphosis or false form is a figure through which the superficial layer of the text would not correspond to its deeper message: based on biblical prophecies and Bandarra's ballads, Vieira creates the image of a universal and Christian Fifth Empire under which, however, one may distinguish the project of a vast Portuguese empire. As to the contradiction (theme of the second part), Vieira's missionary works reveal an acute contrast between the struggle for freedom of the indigenous people from Maranhão and the acquiescence in the enslavement of black Africans. One may also perceive contradiction between this conformist attitude and the vehement defence of equality among all men created by the same God and redeemed by the same Savior

Corpo/corporeidade do negro

“…Corpo/corporeidade do negro Os Sermões do Padre Antônio Vieira, da ordem dos jesuítas, ainda no Brasil colônia, trazem um pouco do entendimento da época acerca do negro. Bosi (1989;2009) um estudioso dos sermões do Padre, analisa as contradições do eclesiástico em seus discursos religiosos validando o regime escravocrata. O corpo do negro assume um caráter de instrumento de trabalho, necessário à organização da colônia, sem o qual, acreditava a branquitude, seria impossível viverem.…”

“…Mesmo diante de situações atrozes, a explicação anunciada pelo Padre Vieira era de que o corpo do negro, embora sentisse as vicissitudes da condição que estavam -escravizados -deveria ser suportada, pois suas almas seriam livres após a morte e como recompensa, seriam conduzidas aos céus (BOSI, 1989;2009). Desde que os negros chegaram ao Brasil as agressões e exploração do seu corpo foram normatizadas pelas leis vigentes e naturalizadas pelos colonizadores, classificando-os como se estivessem à parte da humanidade.…”

“…Analisar a concepção de corpo/corporeidade em Merleau-Ponty, sob o ponto de vista do corpo negro, é o objetivo do presente artigo, bem como refletir a constituição do corpo/corporeidade negro numa sociedade estruturalmente racista, que o nega, o rejeita e o exclui ao longo da história do Brasil. Nessa perspectiva, dialogaremos com Merleau-Ponty (2011), Bosi (19892009), Freyre (2003), Foucault (2008), Kilomba (2019), Almeida (2020), Andre (2007), Nóbrega (2008;2019) e Mathews (2011).…”