A comunicação interatrial tipo ostium secundum corresponde a cerca de 10-12% de todas as cardiopatias congênitas 1 , sendo uma das lesões mais freqüentes na prática clínica. Por ser uma cardiopatia com hiperfluxo pulmonar, resultante de uma sobrecarga de volume de câmaras direitas, e não de pressão, raramente leva a sintomas significativos na faixa etária pediátrica 2 . O diagnóstico geralmente é sugerido pela presença de sopro cardíaco ejetivo em foco pulmonar e 2ª bulha com desdobramento constante e fixo em criança com crescimento pôndero-estatural normal. Classicamente, na radiografia de tórax são encontrados área cardíaca discretamente aumentada, hiperfluxo pulmonar e abaulamento do tronco pulmonar. O eletrocardiograma geralmente mostra sobrecarga de ventrículo direito 1,2 . Entretanto, tais achados podem ser sutis e passarem despercebidos em consultas de rotina, tendo o diagnóstico realizado apenas na adolescência ou idade adulta. Não é infreqüente o seguinte cenário clínico: paciente de 30 anos, do sexo feminino, assintomática, dois partos normais anteriores sem complicações, ausculta cardíaca típica, área cardíaca normal à radiografia de tórax e ecocardiograma mostrando comunicação interatrial do tipo ostium secundum, de cerca de 10mm, com discreta repercussão hemodinâmica. O que fazer? Qual é a indicação de tratamento em uma paciente adulta assintomática? Qual o método terapêutico de escolha neste caso? Cirurgia X prótese? Como em todos os casos limítrofes em medicina, as respostas não são simples, exigindo reflexão maior.A pergunta chave, neste caso, em relação à indicação, deve ser: o que é discreta repercussão hemodinâmica? Mesmo pacientes com grande comunicação interatrial e ventrículo direito de dimensões muito aumentadas podem ser assintomáticos e apresentar evolução clínica semelhante ao caso apresentado. No entanto, sabe-se que inúmeros problemas clínicos começam a aparecer após a 3ª, 4ª, 5ª e às vezes até a 6ª década, incluindo arritmias secundárias à dilatação atrial direita (fibrilação atrial, flutter, etc), doença vascular pulmonar, disfunção ventricular direita sistólica, disfunção sistodiastólica esquerda (por alteração crônica da interatividade ventricular e anormalidade da contração do septo interventricular) [1][2][3][4][5] . Tais problemas trazem conseqüências clínicas, como palpitações, cansaço, fadiga, limitação das atividades diárias e conseqüente piora da qualidade de vida. Infelizmente, a oclusão tardia do defeito, pelo método cirúrgico ou por prótese, não elimina muitos destes problemas clínicos crônicos, principalmente arritmias e disfunção ventricular [1][2][3][4][5] . Se ainda há shunt atrial esquerdodireito significativo, a oclusão tardia tem algum efeito bené-fico, reduzindo o hiperfluxo pulmonar, com impacto na melhoria dos sintomas, como dispnéia, cansaço aos esforços, tosse crônica e bem estar geral [6][7] . Curvas atuariais de sobrevivência mostram uma redução significativa da expectativa de vida em pacientes com comunicação interatrial com repercussão clínica não operada...