Em março de 2020, o Jornal Agência Pública publicou a seguinte manchete: "Nas maternidades, a dor também tem cor" 2 . O texto apresenta experiências vivenciadas cotidianamente por mulheres negras nas maternidades e, também, resgata o ponto central da questão de iniquidades em saúde no Brasil. Dentre os depoimentos, está o de Michele Monteiro, 42 anos, negra, que implorava por anestesia e pela cesárea e, durante o intervalo das intermináveis contrações, ouviu da equipe: "Mas como? Você teve quatro filhos, dois normais (...) por que você não tenta mais um? Você é forte, vai conseguir."Em outubro de 2020, Maiara Oliveira da Silva e sua família, juntavam dinheiro para descobrir o sexo do bebê que a jovem esperava. Entretanto, o sentimento de expectativa pela chegada do novo membro da família foi convertido em luto e preocupação após a gestante, de 20 anos, negra, ser atingida 3 na barriga por uma "bala achada" 4 durante uma operação policial no Complexo da Maré, Zona Norte do Rio de Janeiro. O bebê não resistiu e Maiara ficou em estado grave por semanas."Arruma as coisas do seu filho que o Conselho Tutelar está vindo buscar ele daqui a 30 minutos." 5 Yanca Miranda, 21 anos, negra, ouviu essas palavras da assistente social enquanto amamentava seu bebê na sala da maternidade. Durante os 19 dias que Yanca esteve internada no hospital, ninguém a alertou sobre a possibilidade de seu filho ser levado para um abrigo. "Disseram apenas que eu ia passar uns dias no hospital em observação porque estava escrito no meu cartão de pré-natal que eu era usuária de drogas.", disse a jovem.O discurso social acerca da maternidade pressupõe a existência de um vínculo natural entre mãe e filho desde antes do nascimento, espera-se da mulher o "instinto nato da maternagem", ou seja, do cuidado para com o recém-nascido. No entanto, os casos apresentados retratam as violências experienciadas por mulheres negras durante o momento maternal, expressas pela violência obstétrica que atinge seu corpo, pela "bala achada" que atravessa o seu ventre ou pelo sequestro do Estado, em casos de retiradas compulsórias de bebês. Logo, mulheres negras são a todo momento impedidas de exercerem a maternagem (PASSOS, 2021).Nesse sentido, salientamos que essas violências têm como ponto comum o racismo que está imbricado em todas as relações sociais e institucionais, tendo como alvo a população negra. Assim, denunciamos que há em curso um movimento de controle e extermínio dos corpos e *