A ceroplastia e a medicina legal na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, 1934-1950

Abstract

Resumo O artigo busca investigar as relações entre a ceroplastia e a institucionalização da disciplina de medicina legal na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. As peças em cera, representando doenças ou partes do corpo que seriam objeto da perícia médico-legal, foram produzidas por Augusto Esteves entre 1936 e 1960. Supõe-se que a produção ceroplástica representou o programa traçado por Flamínio Fávero, catedrático de medicina legal entre 1923 e 1955. A comparação entre as peças de cera do acervo do Museu Técnico-científico do Instituto Oscar Freire e o tratado de medicina legal de Fávero, publicado pela primeira vez em 1938, indica que tal suposição é plausível.

Aplicação De Metodologias Ativas De Ensino No Estudo Da Anatomia Humana Frente Ao Modelo Tradicional

“…). Observa-se ainda, que tais estudos, utilizando fetos humanos ou natimortos podem contribuir para o acréscimo de informações pouco referidas ou até mesmo não relatadas na literatura atual, corroborando no entendimento e aprofundamento a respeito evolutivo das patologias no adulto(CARRETA, 2016).Assim, há uma atualização de conhecimento sobre variações anatômicas e das relações de diversos órgãos, visto que o acesso a um cadáver fetal se encontra em maior disponibilidade, tendo em vista que por muitas vezes, esses fetos ou natimortos são desprezados pelos familiares ainda no cerne hospitalar, como descarte de material biológico. Esse material biológico, pode ser utilizado tanto para a exploração, com visão meramente científica, podendo se fazer comparações dos órgãos fetais com Na formatação desse estudo, além do relato vivenciado foram utilizadas as bases de dados informatizadas do Portal da Capes, PubMed, SciELO, BIREME, ao entender que os órgãos humanos respeitam uma diferenciação macro e que podem permanecer ainda após o nascimento com as mesmas morfologias intraútero ou se modifi car a partir de períodos específi cos (fi guras 02), diferenciando anatomia exclusivamente fetal daquela compartilhada com o adulto, o que faz compreender as patologias evolutivas humanas, bem como fi xar noções embriológicas básicas para o entendimento da organização morfofuncional extremamente válida e essencial na formação médica.Dessa forma, destaca-se a relevância da prática de pesquisas em cadáveres fetais humanos a fim de aumentar a compreensão, domínio da técnica de dissecação dos mesmos, incentivando a busca e elaboração de novas formas de aprendizagem e conhecimento, pois o tema é de pouco conhecimento prático por docentes de anatomia humana.Ademais, o processo de entendimento da anatomia fetal agrega soma na formação do estudante à medida que o mesmo além de auxiliar no entendimento Anatomy, conservation, morphology, thinner.…”

O homem através do Instituto Oscar Freire: história e memória da medicina legal paulista (1902-1944)

“…O vínculo pedagógico entre documentos textuais, esculturas, corpos e seus fragmentos, facilitava a apreensão de uma lógica de sentidos verticalizada típica da disciplina, que compreendia naturalmente a apropriação de pessoas como objetos de intervenção e de musealização pelos médicos -no trabalho, no sexo, no crime e na morte (Antunes, 1995;Modena, 2016). Por essas vias, os conjuntos de peças e as narrativas criadas a partir do acervo comprovavam aos alunos e visitantes o domínio da seara ampliada de atuação do legista, da sexologia a infortunística e a traumatologia, em que o universo de ensino e de pesquisa é simbolizado em suas nuances artísticas e imagéticas, e a medicina legal é apresentada como decorrência inevitável da intervenção científica em corpos lesados, desviantes e anormais (Carreta, 2016).…”

“…Figura n°8 -Escultura de cera nº21: lesão fatal por instrumento pérfuro-cortante 341 Como fac-símiles de pedaços de corpos observados, essas esculturas reproduziam a complexidade do prisma biomédico para lesões e ferimentos, internos e superficiais, de forma a revelar ossos, peles e músculos através da cera, e expor cortes, contusões e inflamações passíveis de apropriação pelos legistas diante de outras especialidades. Expostas enquanto partes alegóricas de roteiros de ensino no museu, as representações dessas lesões auxiliavam a dissipar desconfianças sobre as competências técnico-científicas da medicina legal perante alunos e visitantes, num contexto de crescente especialização da medicina e de toda atividade intelectual (Schraiber, 1988;Micelli, 2001;Carreta, 2016). Figura n°9 -Escultura de cera nº23: ferimento corto-contundente na face 342 Isso porque, de maneira irreversível a partir dos anos de 1930, a medicina enfocou-se no diagnóstico e na terapêutica de entidades nosológicas classificadas segundo agentes etiopatogênicos, que dependem via de regra de mecanismos biomoleculares: em meio as diferentes lesões, inflamações e neoplasias, as especialidades médicas tiveram cada qual que apropriar-se de um objeto nosológico no corpo humano, correlato a um conjunto de terapêuticas apropriado apenas a esse objeto de intervenção (Schraiber, 1988;Mota & Schraiber, 2009;Thomaz, 2011;Jones et al 2012).…”

“…Nesse cenário, a medicina Legal penou para conservar seus objetos de intervenção nas miudezas médicas sobre a morte, o crime, o sexo e o trabalho, e uma definição a partir de sua finalidade social, sem conseguir reclamar uma lesão patológica específica sobre sua alçada terapêutica, mas de forma a reivindicar o corpo judicializado -em seus condicionantes internos e externos -como seu território de aplicação (Antunes, 1995;Weisz, 1998;Ferla, 2009). Figura n°10 -Escultura de cera nº31: rotura do coração 343 Por meio da ceroplastia aplicada ao ensino da traumatologia forense, almejava-se a transmissão de um olhar técnico que orientava o esquadrinhamento de lesões de causa externa pelo perito, mas também era preciso enfatizar que esse olhar se expunha como arte e ofício, mirando a correção médico científica, o andamento adequado da perícia e, em última instância, a garantia da ordem jurídica e social (Corrêa, 1998;Carreta, 2016).…”

Entre pedaços, corpos, técnicas e vestígios

“…Entre um rosto de perfil, mãos solitárias com dedos faltantes, dorsos baleados por projeteis de arma de fogo, fetos parcialmente modelados, himens avulsos impactam o espectador. Sem os lábios vaginais e destacados da genitália, as sucessivas imagens das caixas de madeira colocadas lado a lado e apresentadas porCarreta (2016) simulam colorações e orifícios himenais dos mais variados 97 .Produzidas há mais de quatro mil anos, a modelagem em cera (ceroplastia) configurou-se como um modo de representar, com precisão e durabilidade órgãos e partes internas do corpo, suplantando, assim, a deterioração e a falta de cadáveres utilizados para estudos anatômicos. Iniciada com mais vigor, na França, por volta de 1860, a moulage foi utilizada para melhor caracterizar lesões dermatológicas para97 Meu acesso ao artigode Carreta (2016) já no final da escrita da tese, me levou a entrar em contato com o museu IOF para saber quais eram as normas de visitação.…”