RESUMOEsta pesquisa analisa a influência da Guerrilha do Araguaia (1967Araguaia ( -1975 na história do campesinato da região sudeste do Pará. Desenvolvemos uma abordagem interdisciplinar, articulando a perspectiva da geografia agrária às bases teóricas referentes à concepção de memória social e aos procedimentos de pesquisa da história oral, à luz das novas abordagens sobre representações cartográficas. Por meio de uma cartografia analítica de memórias, tal como entendida por Deleuze e Guattari, tomando como ponto de partida os fatos relacionados à organização guerrilheira e à repressão militar, e tendo como fio condutor da análise as experiências dos camponeses, reconstituímos trajetórias e histórias de vida e, a partir delas, analisamos algumas das dimensões das dinâmicas socioterritoriais do campesinato. Compreendemos a Guerrilha dentro da lógica dos conflitos por territorialização, fazendo parte de projetos divergentes, antagônicos e inconciliáveis para a ocupação, apropriação e uso da terra na região amazônica. Assim, a forma como o Exército reprimiu o campesinato durante e após o conflito armado insere-se nos projetos do governo militar para a ocupação da Amazônia e a memória coletiva evidencia que a relação entre a Guerrilha e a questão agrária ficou evidente para os camponeses apenas após 1975, num contexto em que compreenderam melhor a dimensão política da questão agrária e o papel central da organização do campesinato em sua superação. Ao analisarmos o significado do processo rememorativo do ponto de vista da luta de classes, apontamos as dimensões políticas da memória coletiva que os sujeitos dessa pesquisa trazem à tona. Os relatos evidenciam que a luta que o campesinato mantém com os grandes proprietários de terra também se dá em torno da memória e pela memória, por meio da qual, os acontecimentos do passado são reconstituídos como forma de contestação e subversão à memória imposta ou às tentativas de enquadramento, negação ou silenciamento das memórias não-hegemônicas. Ao articularem as experiências vividas durante a Guerrilha com processos mais amplos que promoveram mudanças na região e resultaram em processo de desterritorialização de muitos posseiros, alguns evocam essas lembranças associando-as ao medo que impossibilitou a participação de camponeses nas organizações de luta pela terra. Outros utilizam as memórias como ferramentas para motivação e conscientização da necessidade de continuidade dessa luta, demonstrando que elas atuam na construção da subjetividade e contribuem para o fortalecimento da organização do campesinato na região. O reconhecimento e reafirmação da legitimidade das lutas do campesinato e seu lugar no processo histórico de transformação social tem como um dos fundamentos a memória dos enfrentamentos e das formas de representações que expressam o sentido atribuído ao passado e sua importância para as lutas do presente. No âmbito da memória coletiva, essas articulações fortalecem a identidade política do campesinato na relação com outros sujeitos, grupos e classes, e trazem o ...