Apesar dos milhões de anos de evolução diferenciada que separam os homens de seus parentes peludos [...] nosso imaginário continua a latejar noite adentro em torno da utopia muriqui. A busca de arquétipos que nos expliquem e nos reconfortem é um vício da humanidade. Uma bengala existencial. Podem inspirar fabulações pueris, nas quais o reino animal confunde-se com um éden edulcorado e ingênuo. Podem resvalar para um determinismo obscurantista, que menospreza o papel da sociedade e da cultura no comportamento do homem.Mas talvez o efeito mais importante dessa busca seja precisamente esse, instigar reflexões não simplistas sobre a natureza híbrida do fato humano, enredadoinexoravelmente -numa teia de opções e imposições (Globo Rural, ano 13, n.149, março 1998).
Abraços de monoSentada à mesa da cozinha, após ter terminado todo o serviço de limpeza da casa, D. Leda estava entretida na conversa com os funcionários e por alguns minutos suas palavras escaparam entre os lábios traindo aquela timidez de quem não gosta de ser fotografada. Ela falava do tempo de sua juventude, em que os habitantes locais temiam atravessar a mata pela estradinha de terra que cruzava a fazenda. O medo era fomentado pela existência de fantasmas (ou espíritos) de monos.1 Naquela época, os monos eram temidos como animais selvagens que, acreditava-se, atacavam os transeuntes à beira da estrada. As ameaças vinham por meio dos gritos, dos arremessos de galhos e dos abraços que transformavam animais medindo até 1,20m em seres ainda maiores.Ter vergonha de tamanho sentimento de medo só faria sentido a partir da chegada de outros seres à fazenda em meados dos anos 1970: os biólogos.