O TRABALHO EM ANDRÉ GORZ: três reflexões, uma problemática

Abstract

Há aproximadamente dez anos André Gorz morreu, deixando ideias estimulantes sobre os limites e a necessidade de superação ou desconstrução da sociedade capitalista. Sempre atento às transformações sociais, Gorz chegou, em certos momentos, a sintetizar tudo que havia de mais profundo e crítico na teoria social. Entretanto, é possível observar, em sua obra, uma oscilação em relação ao lugar social que o trabalho ocupa. O lugar do trabalho parece mudar em função do desenvolvimento das forças produtivas. Assim, a análise do movimento social do trabalho na sociedade capitalista, realizada por Gorz, permanece prisioneira de uma determinação tecnológica e de um conceito de trabalho limitado ao universo produtivo das qualificações profissionais. Neste artigo, tenho como objetivo problematizar a concepção de trabalho exposta por Gorz em três de suas principais obras: Estratégia Operária e Neocapitalismo (1964), Adeus ao Proletariado (1980) e O Imaterial (2003), demonstrando como a teoria social e as alternativas políticas desenvolvidas por Gorz mudam vis-à-vis o lugar social ocupado pelo trabalho nessas obras.

O Empreendedorismo Contemporâneo ou uma Forma de Mistificação das Relações de Classe

“…Além disso, acompanhamos os painéis de debates e participamos dos espaços de socialização do workshop. Desse modo, as atividades, mesas, palestras e visitas guiadas pelo Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel) 9 nos auxiliam a descrever e analisar como se configura o que, em outro artigo, denominamos como "modo de vida empreendedor" (Amorim;Mevis, 2021Mevis, e 2021a e como compreendem a sua inserção nos processos produtivos e de serviços, buscando, com isso, analisar a tentativa de apagamento ou mistificação da divisão e das contradições entre as classes sociais pelo discurso empreendedor, tal como elaborado e divulgado pelos seus intelectuais orgânicos encontrados em nossa pesquisa de campo. De modo a expor um panorama geral dos nossos 16 entrevistados: 5 se declararam proprietários de empresas -dentre estes, ao menos dois possuem um aporte financeiro familiar que possibilita a sua manutenção.…”

“…Nossa análise parte da constatação de que o empreendedorismo se constitui como um modo de vida 10 (Gramsci, 2001) hegemônico, nas sociedades neoliberais contemporâneas, imposto às classes subalternas, marcando uma nova forma social de produzir, de agir e de sentir, em resumo, de se reproduzir socialmente (Amorim;Mevis, 2021). Tal novidade tem relação direta com as transformações sociais, culturais, econômicas, produtivas e tecnológicas impostas pela emergência do neoliberalismo, o qual teve sua implementação política em diversos países a partir da década de 1970, tendo se constituído no Brasil a partir da década de 1990.…”

“…Parafraseamos estas teorias para indicarmos como a atual valorização do empreendedorismo também buscaria pôr fim à classe trabalhadora; porém, agora não mais a partir de transformações nos processos produtivos que diminuiriam a importância do trabalho vivo, mas pela própria negação da condição de classe dos trabalhadores. Para uma crítica às teses do fim do trabalho, ver:Amorim (2017;2018).…”