Este artigo tem como principal objetivo contribuir para uma compreensão dos processos de legitimação das elites musicais portuguesas, atendendo aos padrões de mudança durante o século XIX e inícios do século XX. A investigação remete para uma prosopografia dos 460 músicos mais bem-sucedidos que viveram ou estiveram em Portugal entre 1860 e 1930, um período de expansão e reconfiguração das estruturas de ensino musical. Proponho que, para efeitos analíticos, a população selecionada a partir de dicionários especializados corresponda à elite musical. Em estudos anteriores verificou-se que uma das estratégias de reconhecimento dos músicos em Portugal estava ligada à internacionalização. O campo musical português compunha-se, aparentemente, de músicos que transitaram por outros países e culturas, fosse pelas estratégias de migração, fosse por períodos de estudo numa grande capital europeia. Esta ligação entre a constituição de um capital simbólico e os movimentos transfronteiriços foi aqui analisada. A observação das trajetórias de gerações de músicos permitiu desconstruir parcialmente esta hipótese: a relação com o estrangeiro –fosse por e/imigração, fosse por estudos num país vizinho–, era na verdade muito rarefeita. Reconhece-se que a aquisição e manutenção do capital simbólico está entrosada com os processos de transmissão da disposição artística dentro da família, que garantiram, durante gerações, a disposição artística e os conhecimentos específicos que caraterizam o capital musical. Estes processos de transmissão familiar foram beneficiados pela internacionalização das trajetórias, mas, pelo menos nesta época, a internacionalização não se evidencia isoladamente como principal fator de sucesso.